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Nenhures

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Quando era novo (que o fui...) entrámos na CEE, ao país chegou imenso dinheiro, nisso imensa gente se tornou verdadeira consumidora - afã que, no meu caso, recordo com efectiva saudade. Nessa era houve também uma revolução tecnológica, a televisão emitia a cores, os jornais desportivos tornaram-se diários, inventara-se o CD e, imagine-se, nas melhores casas até havia telefones portáteis.
 
Nesse mundo de abundância grassaram os publicitários, de imensas remunerações, frenesim laboral e mesmo legitimação intelectual (O'Neill, lembremo-nos, e não só). Nisso tornaram-se até "criativos", tamanha reputação que chegavam a ser convidados para as mesas alheias, onde debitavam os "conceitos" que conduziam a sua inovadora profissão.
 
O tempo passou, a gente consumidora reforma-se, os que chegam a crescidos já só "clicam", é o primado do "scroll down". Decerto que ainda haverá publicitários mas não sei se ainda são convivas apetecidos... Até porque, entretanto, fomos percebendo que bem antes já havia quem tivesse "conceitos", "criativos" perspicazes que bem sabiam vender qualquer tralha...

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(José Craveirinha, retratado por Sérgio Santimano)

Hoje é o centenário do nascimento de José Craveirinha. Falta-me verve para botar o que gostaria de dizer sobre o que ele escreveu. E as minhas estantes estão para além do Tejo, faltam-me os livros dele, os meus vincos e sublinhados. Sabendo-o ainda por cima poeta "engendrador da nação", na complexidade do que isso é, bem para além do panfletário, muito mais para além.
 
Mas deixo este pequeno excerto de um poema (Hino à Minha Terra) escrito no ano em que eu nasci e no qual diz "“O sangue dos nomes / é o sangue dos homens / Suga-o também se és capaz / tu que não os amas” (...) “todos os nomes que eu amo belos na língua ronga / macua, suaíli, changana, / xitsua, e bitonga” - e talvez os meus amigos possam perceber a minha imensa (recente) irritação com os da "cultura" e das "boas causas" que falam em "dialectos bantu".
 
Mas de facto nem era disso que eu quereria escrever, cá de longe no espaço e no tempo: era mesmo sobre a memória da minha primeira visita à Mafalala, eu espantado (e guloso) com aquele museu de arte moçambicana e a passarmos horas a falar de... futebol e atletismo, naquela então ainda sua mágoa com a emigração da grande Mutola; ou de o encontrar numa manhã no Desportivo e da magnífica conversa sobre a história do desporto em Moçambique, a que se juntou - por feliz acaso - o meu tão querido José Luís Cabaço. Ou a apresentação do "Babalaze das Hienas", após o qual se seguiu uma romaria à sua casa na Mafalala (uma tradição naqueles momentos, afiançaram-me, devido à minha enorme relutância em ir onde não fora convidado), num grupo onde estava o Nelson, a Cesaltina Pinto, e outros, tudo capitaneado pelo Eduardo White, sendo que o Dino levava também o megafone. E o Zé Craveirinha não nos abriu a porta, sem paciência para os jovens barulhentos... E um fim de dia, após ter ele sido condecorado pelo nosso PR Sampaio, em que ficámos os dois sozinhos, ali na Nyerere, ele falando de Aljezur, dos Craveirinhas de lá (que visitara já após a honraria do prémio Camões) e que de facto foi uma hora de loquaz amor filial, lembrando seu pai - algo cuja intensidade só terei percebido anos depois, quando o meu pai também passou a memória. Ou tantos outros detalhes, pequenas maledicências, pensamentos avulsos, num (juro) "você é um gajo porreiro, por isso lhe digo...".
 

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Deixo aqui uma memória, que me é muito cara: quando o Craveirinha fez 77 anos organizei-lhe uma festa (institucional) de aniversário. Ele gostou (até porque naquela época, convulsa, ainda lhe não abundavam as homenagens, algo que pouco depois felizmente começou a ocorrer). Noto agora com prazer saudoso que atrás, nas paredes, estava Shikhani, o meu mais preferido das artes moçambicanas. Foi um belo dia.
 
Para quem tiver interesse deixo ligações para alguns dos postais de blog que ao longo dos anos fui colocando a propósito de Craveirinha:
 
A actualidade de José Craveirinha: (também) sobre o turismo.
 
 
Saborosas Tanjarinas d' Inhambane: o sempre actual poema.
 
Craveirinha e Knopfli: a propósito de um livro do qual tenho o orgulho de ter induzido a edição: "Contacto e Outras Crónicas" de Craveirinha/"A Seca e Outros Textos" de Rui Knopfli, uma antologia organizada pelo excelente António Sopa
 
O Albino e o Hóspede: crónica de uma homenagem que lhe foi feita após a sua morte.
 
Alugam-se Quartos: sobre a especulação.

Craveirinha Póstumo: aquando da publicação do seu primeiro livro póstumo.
 
No Xigubo: um excerto do "África".
 
Adenda: a RTP transmitiu um adequado comentário aquando do centenário do nascimento de José Craveirinha. Está aqui disponível. Tem um formato algo institucional - e poderia ter sido editado, expurgado de algumas, poucas, redundâncias - mas é bastante interessante.

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Leio o "Público", o que me é raríssimo (por hábito limito-me a ler as colunas semanais de Ana Cristina Leonardo e de António Guerreiro). Mas a edição de hoje dá um enorme destaque a Paulina Chiziane, com entrevista. Por isso acorro ao papel, a ver o que diz a Paulina. E deparo-me com a introdução do jornal, enquadrando-a, nisso dizendo-a falante "do dialecto bantu". Em 2022!!!! E logo no boletim da demagogia "póscolonial"....!!!
 
Diante disto logo clamo, em monólogo altissonante, citando Milhazes!!!
 
E depois atirei o jornal para longe, entre outras imprecações. Lá para domingo ter-me-á passado a irritação e irei ler, curioso do que disse a Paulina. Em dialecto latino, presumo...
 
Adenda: em contributo para a agenda de "reparação da História", tão cara à célula neo-comunista do "Público", deixo a certeira boutade divulgada por Max Weinrich, "A língua é um dialecto com exército e marinha".

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A organização "Repórteres Sem Fronteiras" organiza um anual Relatório de Liberdade de Imprensa Mundial. Este ano coloca Portugal no 7º lugar em termos de liberdade de imprensa, num universo de 180 países. É muito bom (e sobre isto será de ler um texto de António Barreto, num contentamento sem triunfalismos).
 
Não quero deixar de referir o quanto esta avaliação sublinha a hipocrisia e a desonestidade intelectual (ou seja, pessoal) da amálgama de intelectuais (académicos, quadros, jornalistas, colunistas) comunistas ("brejnevistas" e "esquerdistas") que vêm reclamando serem "perseguidos" e "criminalizados" devido à sua adesão ao imperialismo russo. Pois, como isto comprova - se tal fosse necessário - publicam as suas "teses" onde e quando querem. E seguem desprovidos de pingo de vergonha que seja...

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Estou numa esplanada, ao Vale dos Barris, com uma bela imperial mas sem um livro. Por isso corro o FB, a distribuir laiques como se estivesse no metro. Nisso vejo que Byrne fez 70 anos há 6 dias. E lembro-me que há 30 e tal anos, espólio acabado de cumprir, regressei à casa paterna, olhei para o meu quarto desde a meninice e arranquei da parede (guardando-os) os dois últimos resquícios da adolescência: Lou Reed (em "poster" da Música&Som) e a fotocópia da letra desta "Once in a Lifetime". Arranquei-os da parede, e fiz mal, mas não cá de dentro.

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