01
Jan23
Ano Novo, Vida Nova
jpt
The Byrds - Eight Miles High - 9/23/1970 - Fillmore East (Official)
As mudanças de ano aparentam que há ciclos conclusos e simulam o advento de reinícios, apenas a ilusão da regeneração, a própria e a colectiva. Por isso tendemos a preencher a quadra festiva com rescaldos, os rores das maleitas havidas e a ultrapassar. E proclamações, queridas como sínteses iluminadoras do tal rumo novo a que nos aprestamos. E sempre róis de decisões, acções a cumprir, promessas que são purga para que se cumpra a nossa ascensão. Nisso o Ano Novo, Vida Nova...!
Assim o tornei a fazer, ainda iludido disso de que ontem algo se acabava e de que hoje será um novo dia. Como (me) é devido fui cáustico no rescaldo. E conciso nas decisões, apenas uma, de tão ambiciosa: uma ecdise, libertar-me desta carapaça atrofiadora, e afunilar-me, nunca facilitar, concentrar-me, focar-me, e que nem seja durante um mero mês, que não de mais precisarei, libertar-me dos pendentes, esmagadores até... E neste passo moral alijei o peso nos ombros, saí ao campo de sorriso lesto para concluir o meu trapalhão 22.
E nisso, ao fim da tarde, já na senda deste urgente "focar-me", lá cruzei o estuário, numa via de 60 kms rumo à casa de belo amigo, cozinheiro de mão-cheia, ontem aniversariante. Repasto farto, convívio agradável, a meia-noite cruzada, ecos do fogo-de-artifício, o espumante bebericado. Pelas duas da matina seguiu-se o regresso a casa, os tais 60 kms.
À chegada, saindo do carro, noto que esquecera o telefone. Coisa nada, sei-o, mas que enraivecido "f...-se, só faço m.....!", nesta evidência que 22 não acabou nem acabará, e nem sequer terá começado. Pois isto é apenas um longo e perene bordejar, de rumo esconso e leme desfocado. E não há brindes, nem mesmo o saudoso "yô-yô e uma garrafa de rum", que o iluminem. Resta vivê-lo com uma boa música, às vezes com o bom Rock. Deitar-me com os velhos Byrds, como hoje... Nada começa, nada reinicia. Dá para aguentar.