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Nenhures

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Como é mais do que normal tendemos a apagar as memórias do que nos encheu o quotidiano durante os recolhimentos provocados pela Covid-19. E poucos ainda se lembrarão das polémicas, de dichotes feitas, devidas à disseminação das intervenções televisivas feitos em retiros domésticos e transmitidas via Zoom (uma empresa que muito se divulgou então) ou afins. Nelas se criticava, com sarcasmos e iras, aquilo dos intervenientes apareceram diante de estantes com livros. "Pose", ululava o povo irado..., assim como se os "sans-culottes" se tivessem tornado agora nuns "sem-livros" (ainda que com computadores para as redes sociais) mas mantendo as "virtudes" morais e o fado histórico salvífico. Alguns, com fel mais analítico, dissecavam os conteúdos bibliográficos perceptíveis. E outros, porventura de pendor mais estético, registavam criticamente algumas alterações nas lombadas visíveis nas casas dos participantes regulares - nisso mostrando a crença, até dogmática, de que as disposições nas prateleiras devem ser perenes, intocadas..., como se altares (votados a um qualquer Demo) sejam. Face a tal alarido aprendi que nas redes sociais é melhor não mostrar livros e pouco deles falar, não vá o tal Demo tecê-las e dizerem-me com poses de letrado, logo arrastando-me desta salamandra até à guilhotina (moral ou mesmo real), aposta no largo do pelourinho da freguesia digital.
 
Mas abro agora uma excepção, por causa da excitação que vou vendo nas redes sociais, onde alguns incautos (pois falam de livros) se multiplicam na referência a dois livros - confirmei que recentemente traduzidos e publicados em Portugal. Ao primeiro tinha visto uma referência elogiosa (tipo "leitura imperdível"), emanada por um desses políticos que vão à televisão "comentar" a política e depois nos dizem o que ler, ouvir, ver e etc. - função "magisterial do pensamento" antes atribuída a curas ou lentes e agora a ex/actuais/futuros governantes "anunciados na tv". Nessa noite, ao ver a referência em pleno telejornal dominical, sorri ao saber a Ruth Benedict - uma quase founding mother da antropologia - ser promovida a imperdível para o público em geral em pleno 2022.
 
Mas enfim, o que vinha desabafar é que mantenho o sorriso diante desta tanta adesão ao "A Espada e o Crisântemo", o Japão de Ruth Benedict, e ao "Como a Europa Subdesenvolveu a África" de Walter Rodney. Livros importantes, significantes, com temas, pressupostos, corolários bem diversos. E acima de tudo livros ensaísticos dos seus tempos, verdadeiros "clássicos", com valor intrínseco, inseridos nesta continuidade cumulativa que é a das reflexões histórico-antropológicas. Mas que agora provoquem frémitos leitores, devidas à sensação de encontro com as verdades ali patentes, é um bocadinho sinal do que para aqui vai... Enfim, talvez daqui a 50 ou 70 anos se publiquem outros livros sobre estas temáticas, escritos nestes nossos dias. E que então também serão considerados "imperdíveis" na sua actualidade e pertinência... E as pessoas (algumas) também se excitarão. Ou então talvez o mercado editorial português mude durante essas próximas 7 décadas...
 
Pronto, dito isto, e porque sou muito actual nestas coisas das leituras vou deitar-me a ler "Os Cheuas de Macanga" de António Rita-Ferreira. Boa noite. E não leiais muito. Ou, se o fizerdes, nem às paredes o confesseis. Que elas têm ouvidos...

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A bica da manhã com amigo, ele décadas de empresário ("empreendedor", diz-se agora) do turismo - o que não é sinónimo de "industrial" da hotelaria e "restauração" (mais termos em voga, que sublinho nas aspas não vão os leitores pensar que me actualizei no papaguear). E se eu sou dos que em relação ao (governo) PS dizem "mata" ele é mesmo daqueles que logo clamam "esfola"! E assim o assunto - até porque ele não é de futebóis - que logo brota é este esboroar do governo e adjacentes, escandaleiras, demissões, acusações, bifidismos presidenciais, condenações, imprecações e até prisões.

Ora eu hoje acordei a modos que andrógino, qual Schiele, e até me venho sentindo assim. E resmungo o que senti na alvorada ao ler da demissão do assessor do primeiro-ministro, condenado em tribunal. Nunca ouvira falar do agora convicto Magalhães Ribeiro e nada simpatizo com o perfil, um socialista ex-presidente da câmara (Cartaxo) apeado em eleições e repescado para os gabinetes de São Bento. Parece figura típica... E do caso só conheço o que é dito nos jornais - deve ser uma peça da LUSA, por todos reproduzida. Mas se isso é o cerne da questão, caramba!... Ao que parece o homem, então ainda autarca, escreveu (ou um assessor dele) na página camarária no Facebook que reunira com a ministra da Saúde (a inefável Temido, a "super-Marta" para os socialistas) em plena pandemia. E que esta lhe prometera instalar uma qualquer infraestrutura sanitária no concelho... E agora condenam-no em tribunal por "más práticas" propagandísticas, pois aquilo coincidiu com um tal de "período pré-eleitoral". Mas bem se sabe que o uso dos meios de comunicação municipais para engrandecimento próprio e dos seus partidos é uma tradição - quando regressei a Portugal escrevi aqui do meu espanto, até enjoado, com esse tipo de desplante caciquista que encontrei na minha freguesia Olivais. E muito mais e até pior vi depois, nos Olivais e na rede de freguesias de Lisboa. Ainda assim a sentença deste caso no Cartaxo parece-me um abuso, um exagero. Não só devido a essa tradição comunicacional nas autarquias mas também ao seu conteúdo específico. Ou seja, ou isto se trata de uma cena tipo "evasão fiscal do Al Capone", apanhar um gabiru pelo único rabo de palha que tem - o que me parece ser muito rebuscado - ou então é um exagero judicial.

Por outras palavras, será um caso de "justicialismo" (eu sei, o termo tem outro significado mas vem sendo hábito usá-lo assim, e tenho de me actualizar, como acima deixei implícito), um tribunal a proferir uma sentença "exemplar". E não sendo eu lido em ciências jurídicas nem na filosofia do direito tenho a vaga impressão de que não há pior do que "castigos exemplares". E assim cada caso terá circunstâncias atenuantes e/ou agravantes. Mas não deve ser "exemplar", qual lição aos "vulgares", os da sociedade, proferida na vara do senhor doutor juiz. E se assim surgir torna-se um abuso... E é isto que me parece o affaire Cartaxo, concluía eu, já em mudas ânsias de uma segunda bica e, até, da partilha de um dos saborosíssimos jesuítas da casa.

Enfim, perorava eu a minha tendencial simpatia para com o socialista em causa esperando uma reacção abrupta do meu amigo, o tal "esfola" dedicado a este triste estado da república. Quando avança ele, impaciente até me querendo interromper a prosápia. Dizendo-me que pior ainda, por assim dizer, é o caso da antiga secretária de Estado do Turismo, Rita Marques. Afiançando-me que a senhora foi - e que é esse o sentimento daquele sector económico - uma boa governante: vinda de outra área, apanhando o Covid-19 e o colapso da actividade, percebendo bem a situação, promovendo de modo eficaz os possíveis apoios, não aparentando ter vieses favorecedores ("um gajo nunca sabe, mas não pareceu nada...", é a expressão canónica). Enfim, foi alguém competente, ágil, empenhado. Terá sido uma surpresa a sua não recondução, foi homenageada pelos agentes. E o mais normal é que tenha sido contratada - e até terá havido concorrência nisso - para trabalhar no sector... "Será, mas é ilegal", ripostei eu, azedo dado que o jesuíta afinal não tinha sido encomendado. "Sim, será", responde-me, mas que quererei eu?, "a senhora não é política, é independente, vai deixar de trabalhar?..."

Entretanto já se fez tarde, temos de avançar ao nosso destino, seguimos ao Sado. Fartos deste poder mas ambos, talvez cândidos, sentindo que há por aí uma histeria, talvez até anseios necrófagos. Contestemos, claro - no mercado paguei um panito por 400 escudos e o padeiro logo me avisou que para a semana custará mais 30 - mas há que calibrar o tom...

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