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Nenhures

Nenhures

28
Abr23

No Museu Botero

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De Portugal enviam-me novas de uma polémica sobre condecorações às mulheres dos presidentes da república que nos visitam. A presidência já se veio explicar, num texto pungente: pois na justificação confunde a atribuição de condecorações a rainhas e príncipes consortes às atribuídas a cônjuges de presidentes. Ou seja, resmungo eu, temos um presidente e seu gabinete que não percebem a diferença entre república e monarquia. Entendam os distraídos: ao receber-se um casal real é absolutamente curial condecorar ambos, pois os dois têm estatuto político no seu ordenamento monárquico, ao receber-se um presidente da república é totalmente descabido condecorar o seu cônjuge, pois este não tem estatuto político no seu ordenamento republicano. Enfim, minudências dirão, mas bem demonstrativas da superficialidade reinante. Aliás, presidencial. 

Mas é um breve resmungo meu, mais lesto do que me levou a escrever isto. Desligo o WhatsApp, sorvo a tisana de coca, saio da esplanada e entro no belíssimo Museu Botero. E logo dou com esta "Primeira Dama" - e sai-me uma gargalhada, sonora. Pois que melhor resposta àqueles dislates lisboetas?

27
Abr23

Na Feira do Livro de Bogotá

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A ascensão andina avassalou-me, abalroado que fui pelo soroche, dizem-no aqui assim, esse mal da montanha ao qual a minha mitografia máscula presumia ser eu imune. Assim couberam-me dois dias de restauro caseiro e ao terceiro, ainda trôpego, fui ver as vistas. E ocorreu-me cruzar a célebre Feira do Livro de Bogotá, uma enorme organização pejada de livros e de gente deles leitora. Estava avisado de que na secção internacional havia um pavilhão português e aprestei-me (ainda que devagar, dado o tal soroche) a procurá-lo. Para minha surpresa - pois o pavilhão destoa das circundantes representações nacionais. De facto, e exceptuando a delegação do México - pois este sendo o país convidado deste ano e dotado de um enorme pavilhão - a representação portuguesa, organizada pela Embaixada em Bogotá e pela Cátedra Fernando Pessoa da Universidade dos Andes, é uma delícia, contrastando com o cinzentismo até vácuo dos outros pavilhões internacionais. Montado e decorado com imenso bom gosto, dotado de uma boa panóplia de livros portugueses, também evocando os autores que este ano cumprem os seus centenários. Mas acima de tudo preenchido por uma vasta dose de edições colombianas de autores de língua portuguesa, uma excelente escolha apresentada em livros muito bem feitos (bonitos, se se quiser) e, ao que me dizem, muito bem traduzidos. Uma colecção que segue imparável, tanto que me disseram ser hoje mesmo apresentado mais um livro, o "Myra" de Maria Velho da Costa - ainda estou a ver se arranjo fôlego para atravessar esta metrópole ao encontro dessa sessão...

Mas o meu maior agrado foi mesmo este, o de saber que este ano o pavilhão português escolheu convidar como autor de língua portuguesa o moçambicano João Paulo Borges Coelho, muito a propósito da recente publicação aqui da tradução do seu delicioso "Crónica da Rua 513.2". Será também hoje que o escritor falará da sua obra no centro dedicado a Gabriel Garcia Marquez. Lá me arrastarei eu (literalmente, dado o estado alquebrado de que ainda não me libertei) até ao acontecimento. Pois Borges Coelho em Bogotá é coisa para não se perder...

25
Abr23

Deputado Mithá Ribeiro

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Isto da política… o que raio faz um intelectual laborioso como Gabriel Mithá Ribeiro avançar para uma patetice destas?, algo que o apoucará para sempre. Quereria levantar a bandeira ucraniana devido às posições sobre o assunto tidas pelo visitante presidente brasileiro? Enfim, não sendo obrigatório não seria totalmente descabido, era posição sobre política internacional. Mas o resto? Que tem o parlamento português a ver com os debates da política interna do Brasil? Dos outros truculentos poderemos nada mais esperar, mas de Mithá Ribeiro? Pobre homem, a cumprir um sonho de intervenção pública e a acabar nestes pobres modos.

21
Abr23

O centenário do meu pai

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O meu pai, António Pimentel, faria hoje (21.4) 100 anos. Se cá estivesse resmungaria comigo "Zé, vê lá bem se ainda tens idade para isto", este descer o raudal (pode ser "rápidos") do Guayabero e todas as outras caminhadas, mata acima, mata abaixo. Mas também é verdade que ele está cá, agora mesmo já centenário, eu a acumular histórias desta zona de guerrilhas e paramilitares, ditadores fascistas ou quejandos e resistências camponesas, indução do plantio de drogas por gringos e estes mesmos a combaterem-nas. E, mais do que tudo, de desflorestação e de índios devastados. Isto para lhe contar d(est)as maleitas do mundo. Enfim, tenho de comprar um bom rum para lhe levar daqui e com ele falar disto tudo.

20
Abr23

Na Colômbia

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Há dias que justificam isto tudo que vai ocorrendo, a dita vida. Desde a alvorada desce-se os esmagadores Andes até ao sopé, cruza-se a planície até ao Guaviare já amazónico e depois entra-se pelo princípio da mata e trepa-se até às pinturas rupestres, de longa mas incerta antiguidade ("Do Templo do Sol à Orelha Quebrada num só dia", comentou depois este miúdo que havia desaparecido em parte incerta e que agora reencontrei). À noite S. José lembra-me... Quelimane.

20
Abr23

Antes da fronteira

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Enorme, a sinuosa fila do controlo de documentação. Estou bem, esta barba rapada, mochila nas costas, sinto-me com o vigor de um Haddock nos Andes, a pertinência de um Mortimer na Atlântida, a “resiliência” - como agora se deve dizer - de um Jonathan nos Himalaias, a rudeza de um Mike Blueberry nas Montanhas Rochosas, a destreza de Buddy em escarpas e planuras, o encanto frágil de Corto em Mu. E até mesmo dono da verve lesta e ferina de Achille Talon. Uma funcionária, uniformizada e com a estrita beleza da sua ainda juventude, avança para mim "Que idade tens?". "Para que queres saber a minha idade?", respondo-lhe na minha língua, ela insiste e eu repito-lhe a negação, num afrontado “mas porquê?”. Mas ela impõe-se, “diz-ma, vá!”. Rendo-me e digo-lha, ela nem sorri no seu ir-se embora, e naquele seu primeiro passo atiro-lhe “nunca mais virei ao teu país!”. O tipo da minha frente ri-se, percebe-me a língua e a angústia, “brasileiro?” pergunta-me em modo solidário e diz-se mexicano, ainda que pareça um baneane de I’bane. Forço-me à meia dúzia de palavras trocadas, aspirando aquele ânimo que ele me oferece. Pois desmascarado afinal Steiner que fui…

19
Abr23

Aeroporto da Portela

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Estou no "check-in" do aeroporto na Portela de Sacavém (ao qual puseram o nome de um militar hitleriano). Uma bicha enorme e imóvel. Não quero ler os jornais desportivos, devido ao meu Sporting. Por isso acorro ao meu WhatsApp: um primo enviou-me uma foto do Marcelo na mesquita a fingir que reza! Fujo dali. Chego ao FB: nos murais da imprensa loas à artista doutorada que "descobriu Fanon", obituário do fotógrafo que "descobriu a beleza dos corpos negros" (!). Meu palavrão matinal e olhos em alvo. E são estes, porque assim, que notam as 2 grandes pinturas publicitárias que monopolizam a sala: em Lisboa a Vodafone coloca uns dizeres ingleses que mimetizam a já velha campanha de Obama. E coloca 7 retratos: um amoroso jovem casal (de negros), um amoroso pai com seu radiante filho às cavalitas (negros), um amoroso casal de reformados (que no Brasil serão ditos "pardos", sob algum apoio de acção afirmativa, e daí o seu ar feliz, recompensado, apesar da idade e evidentes achaques). E um branco - o retrato de Pistorius, o assassino sul-africano! 

E este asco passa. Neste ambiente intelectualmente patético até será elogiado. Murmuro mais uns palavrões. A ver se a bicha anda, para que possa intervalar disto.

15
Abr23

O Affaire Coimbra (2)

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De Maputo continuam-me a chegar novas sobre o "affaire Coimbra". Agora mesmo um manifesto assinado por um grande rol de intelectuais (cerca de 260 pessoas) - alguns dos quais já li para grande aprendizagem minha. O texto é muito justo, convocando Estado e sociedade para enfrentar problemas graves e sempre descurados.
 
Mas é também interessante devido a outra dimensão do seu conteúdo. Pois é um enorme ditirambo contra o "Patriarca Genial" (assim nomeado) mas preservando-lhe léxico (e semântica), reclamando a continuidade de um legado teórico e de militância (mescla dita "activismo", no jargão de agora). E isso é interessante pois será o enterro definitivo nas ciências sociais do país do tópico da "reflexividade", essa crença (até autofágica) de que as condições pessoais e sociais dos investigadores infestam, e até determinam, o discurso analítico. Ora se neste caso é exactamente o contrário (pelo que centenas de intelectuais o assinam) então sintam-se os "mais-novos" livres dessa "maldição"... E os mais-velhos também, mesmo que "tóxicos", "brancos" ou poluídos por outras malfeitorias desqualificativas do mesmo teor.
 
Como está legitimada (e ainda bem) a "autoetnografia", deixo-me perorar nesse rumo. 18 anos em Moçambique, 1 na Bélgica. Outros 6 de facto confinado nos Olivais Sul e na margem Norte do Sado. Dou-me cada vez com menos gente, tanto devido à idade como, decerto, porque vários se terão cansado da minha vacuidade monótona (há quem lhe chame mau-feitio mas não é verdade). Ainda assim, tão afastado do rossio, fui v/lendo o ror de mesuras, de palcos atribuídos (e não só nos jornais mais ligados ao eixo PS-BE), de "respeitinho é muito bonito". E acima de tudo de silêncios críticos - e nisso não incluo polémicas de jornais, que são coisas de outra natureza. É evidente que não leio tudo mas neste quarto de século li 2 ou 3 dos melhores antropólogos nacionais cutucarem, um pouco a latere, as formulações do "Patriarca Genial". E noto com prazer 2 franceses que foram o suficientemente críticos, mas apenas centrados nas suas formulações sobre o percurso histórico português. O resto, repito, mesuras - em última análise "ele é genial mas tem destas coisas" como salvaguarda agora a primeira página do jornal "Público"... E silêncio. E agora mesmo os seus subscritores (até gente que o ombreou no patético gemido de que estava a ser criminalizado devido ao efectivo apoio à Rússia - tropelia a que dediquei um texto de blog que me saiu bem, dinamizado pelo nojo para com aqueles putinescos, o "Da Empáfia Hipócrita") acordam e vêm agregar-se na luta contra... "o patriarcado e o colonialismo". É evidente que a gente pode andar completamente distraída no mundo - mas então não se intitula (e assina) como "grande repórter" (como aqueloutra) ou "investigadora (de ciências sociais)".
 
Cerca de 2005 em Maputo um amigo tinha sido ofertado com dois exemplares de um livro com um bem esgalhado título kantiano. E ofereceu-me um. Era "A Crítica da Razão Indolente". Encetei-o com o tratamento que me é habitual, ler a introdução e, quando há, a conclusão. Fiquei estupefacto. Decerto que devido às minhas limitações intelectuais, porventura por ser também um "positivista" (e "branco" e "tóxico", mas na época ainda não era tão grave sê-lo). Na modéstia do meu calibre fiz aquilo que julgo apropriado a esta condição: escrevi um e-mail a um punhado de colegas que muito respeitava, perguntando-lhes "já leste o último livro do BSS?", com o intuito que algum(ns) me pudesse(m) iluminar, esclarecer, fundamentar aquilo, que me parecera um devaneio ideológico em formato de calhamaço. Uns não me responderam, outros não tinham lido. Mas um, antropólogo a que voto grande respeito intelectual (e muitas leituras), respondeu-me com um evidente carinho de mais-velho, num apenas: "não te metas com o Boaventura". Assim fiz.
 
Há algum manifesto que eu possa agora assinar?
 
(Após este, estoutro e ainda mais este postais)

14
Abr23

Uma maionese

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Sei que os meus amigos têm acompanhado com interesse os meus postais sobre temas gastronómicos. Assim sendo aqui regresso a essa matéria. Hoje com uma receita de maionese retórica, bem do agrado dos comensais... "alternativos".

"Os Princípios e as Práticas"

... comecei a analisar a crescente prevalência e maior visibilidade do poder cru em relação ao poder cozido [eu, jpt, detesto esses ditos "emoji" e por isso prefiro assinalar esta grosseira "apropriação cultural" da dicotomia do grande Lévi-Strauss com uns valentes !!!] tendo-me centrado numa das manifestações deste fenómeno, da vitória sobre o adversário ao extermínio do inimigo. Continuo agora a análise, centrando-me na segunda manifestação, a híper-discrepância (sic) entre princípios e práticas.

Uma Híper-Discrepância (sic)

A discrepância entre princípios e práticas é talvez a maior especificidade da modernidade ocidental. Qualquer que seja o tipo de relações de poder (capitalismo, colonialismo e patriarcado) e os campos do seu exercício (político, jurídico, económico, social, religioso, cultural, interpessoal), a proclamação dos princípios e dos valores universais tende a estar em contradição com as práticas concretas do exercício do poder por parte de quem o detém. O que neste domínio é ainda mais específico da modernidade ocidental é o facto de essa contradição passar despercebida na opinião pública e ser mesmo considerada como não existente.  (...)

Este mecanismo de supressão das contradições reside no que designo por linha abissal, uma linha radical que desde o século XVI divide a humanidade em dois grupos: os plenamente humanos e os sub-humanos, sendo estes últimos o conjunto dos corpos colonizados, racializados e sexualizados. 

Se é verdade que a contradição entre princípios e práticas sempre existiu, ela é hoje mais evidente do que nunca. (...)"

Boaventura Sousa Santos, "Os princípios e as práticas", Jornal de Letras, 17 de Novembro de 2021, p. 30.

13
Abr23

O Affaire Coimbra

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O "affaire Coimbra" já se disseminou na imprensa e no binómio FB-Twitter. Uma colega pela qual tenho simpatia e (muito) respeito - tanto que até ambiciono que tal seja recíproco - recomendara-me há dias: "não te metas nesse lamaçal". Mas a vertigem foi mais forte do que eu próprio, e deixei-me botar um texto - ao dia ainda um bocado elíptico - encimado pela imagem do grande Jason Robards, dando conta da minha diversão... Como nesse postal assumo "sou muito pior do que gostaria", e daí o meu ricto bem-disposto. As razões para tal eram pessoais mas agora, dada a panóplia de reacções, são mais diversificadas, assim mais... divertidas.

Enfrentam (a instituição coimbrã e alguns dos seus funcionários) um texto carregado de insinuações. Talvez sejam fundamentadas, talvez não. Mas são máculas prejudiciais às respectivas reputações - e por isso prefiro que o (decerto enorme) desconforto que agora sentem se deva a acusações infundamentadas, pois mais me deliciará que sintam o ferrete da injustiça e não o chamboco punitivo. Pois é gente que não se coíbe de fazer o mesmo (ou compactuar - como referi no tal postal anterior), insinuações - até se perversas e descabidas -, seja para se engrandecerem ou justificarem ou, pura e simplesmente, por desfastio. "Quem semeia ventos colhe tempestades", anda dito pela Bíblia ou outro qualquer clássico, "cá se fazem, cá se pagam" traduz o povo, esse que tudo sabe...

Há um quarto de século os meus amigos Gil e Cristina casaram. Ainda que convidado não fui à boda, tinha seguido há pouco para Maputo. Nesse sábado festivo, durante a tarde, recebi um telefonema de um grupo de velhos amigos, ali congregados - e já um pouco "acelerados", como era usual nessas ocasiões. A pergunta inicial, em verdadeiro coro, foi "Zezé, o que é que tu fizeste ao Boaventura?" e isto vindo de gente que nada tinha a ver com as ciências sociais nem nunca o lera... Pois na véspera o ilustre alterglobalista publicara uma página inteira na "Visão" a pontapear a minha instituição em Moçambique e a mim próprio - sem ter qualquer razão, como bem o sabia. Dir-se-á que ter uma página de revista com um célebre académico a dizer-me incompetente e relapso é menos grave do que levar no ocaso da carreira com uma onda de apupos por acusações de más práticas relacionais. Garanto que para um puto de 32 anos que se despediu para seguir para um bom emprego no estrangeiro tal não será evidente, e tudo aquilo se me afigurou letal. Daí a rajada de palavrões com que respondi aos meus amigos. Os quais logo terão seguido para mais umas rodadas e, depois, para alongadas danças. E eu terei ido até ao "Piripiri" ou à então "Bússola" beber um uísque e resmungar a vida e pensar como iria regressar à Pátria (António Hespanha tinha-me dito que eu poderia sempre voltar caso corresse mal... mas seria um grande "flop" pessoal). O texto doutoral, um chorrilho auto-laudatório e de imprecações descabidas, em particular sobre o meu chefe de então e sobre mim, chamava-se, nunca o esqueci, "Diplomortos e Etnocêntricos" - "etnocêntrico!?" resmungava eu, antropólogo. Sim, sei que todos somos etnocêntricos, condição inesgotável mas burilável - mas ser assim dito por quem acredita em "lusofonias" e "colonialismo de cama"? E terei bebido mais um uísque debruçado sobre essa temática... Depois disso nem um pedido de desculpa privado. Nem um ressarcir público.

Leio agora as reacções dos "insinuados" coimbrões - um joga a "carta racial", dizendo-se racializado vitimizado. O outro, veterano, conclui que a difamação que sofre se deve ao "neoliberalismo" que polui as solidariedades interpessoais. Isto é engraçado pois dá para perceber como estes "trunfos" são constantemente jogados, a despropósito, e vão sendo aceites pelos "bem-pensantes". Voltando atrás, àqueles tempos, presumo que tenha sido o "neoliberalismo" que levou Sousa Santos a usar as teclas viperinas contra um grupo de funcionários que, com todos os defeitos que poderiam ter, apenas não prejudicaram outros funcionários em deslocação de trabalho para o beneficiar a ele e aos seus coadjuvantes, fazendo-o poupar uns tantos dólares em quartos de hotel (despesas de projecto de investigação, que não do bolso pessoal, entenda-se bem...).

Mas voltando ao agora fervilhante e ao coro dos que assumem como verídicas as insinuações - acabo de ler a partilha de um texto de alguém que desconheço que, enquanto convoca Bourdieu (é alguém das disciplinas), considera que quem põe em dúvida o insinuado no texto é "positivista", saudoso da era em que "mandavam as estatísticas e os homens" (não se refere aos "brancos" mas isso deve ter sido esquecimento) e avesso às "prespectivas (sic, apesar do Bourdieu) feministas". Em mural muito respeitável leio um lamento que "os homens de esquerda" tenham estas práticas - deixando implícito que os homens de centro ou direita terão, por defeito, tais tendências. E as deixarão correr, até desabridas. Entretanto, à "direita" e ao "centro" é um festim, por evidentes razões ideológicas, tendo-se no entanto a infeliz tendência redutora para associar BSS ao BE - de facto esquecem-se que o académico divergiu e tornou-se também notório apoiante e até mandatário do MES, perdão, do LIVRE. E à "esquerda" afiam-se as cimitarras, impiedosas (aliás, lendo as redes sociais mais parece um confronto entre grupelhos m-l, a la PREC).

Há (mais) uma evidência que me faz sorrir. É que não vejo (se é que há) indivíduos a convocarem o direito à presunção de inocência. Eu continuo na minha, nada me obriga a seguir esse princípio. Aliás, a ética convoca-me (e talvez até a lei) a prescindir dele - morto e enterrado o malvado ditado "entre marido e mulher não se mete a colher" se eu vir constantes equimoses na vizinha devo seguir a presunção de culpabilidade do seu marido e avisar as autoridades. Não era assim quando eu era mais novo... A presunção da inocência é um princípio para as instituições, seu funcionamento, salvaguardando direitos fundamentais dos acusados. Ora essa destrinça, que deveria ser evidente, é muito esquecida.

E por isso me surpreende (minto, não me surpreende, apenas noto) a desfaçatez de vários locutores (académicos ou outros) que estão agora a saltar em cima dos "presumíveis inocentes", aludidos num artigo que é... muito fluido, de facto não passando de um diz-que-diz, por mais cativante que seja. Quando esses mesmos justiceiros passaram anos a defender - em jornais, rádio, televisão, blogs (os "jugulares" por exemplo) e mesmo inserindo-se em candidaturas partidárias - Sócrates. Sempre recusando a pertinência de "alusões" - imensamente documentadas, já agora -, sempre clamando, até mesmo após o estertor da proto-candidatura presidencial do prócere socialista, o direito à presunção da inocência do consabido presumível réu.

Enfim, para estes socratistas (socialistas, bloquistas, livristas) é mais imediata e necessária a punição sobre uns quaisquer que façam assédio sexual e moral do que sobre uns tipos que rebentem o país.

Deve ser isto o conteúdo profundo destas posições avessas ao "positivismo" e concordantes com as tais "prespectivas (sic) feministas". Salvem-se o feminismo e as ciências sociais de tamanhas atoardas e seus locutores.

Em suma, sou mesmo muito pior do que gostaria de ser - mas isso já é consabido pelos meus amigos, os visitantes do blog e os meus amigos-FB.

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Bloguista

Livro Torna-Viagem

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