Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Nenhures

azeite.jpg

Na passada semana, durante um aprazível almoço, um bom amigo, homem avisado das coisas do mundo avisou "é melhor comprarem azeite, que ainda vai aumentar mais, e muito", coisas da parca colheita. Atendendo ao estertor em que as minhas garrafas estavam - e ao Agosto mais culinário que me espera - fui agora à "grande superfície", sempre Lidl, abastecer-me do frugal rancho que me cabe mas também para me reforçar do dito azeite. Daquele básico, baratucho, claro. Já não devia comprar há uns tempos, talvez desde Março ou assim, dadas as andanças que tenho tido. Fiquei estupefacto. Boquiaberto. Melhor dizendo, transido! Se não dobrou de preço para lá caminha....
 
Regressei de mãos a abanar. Na expectativa de ir aos rivais, em busca de uma qualquer "promoção" azeiteira, para poupar uns euros para o tabaco. Ou então, logo pensei, passarei a fazer os estrugidos com Queen Margot, que esse ao menos quase não encarece.
 
(Adenda: estou grato à plataforma SAPO pelo destaque dado a este postal).

Geny-750x500.png

Há dois anos que clamo "Hoyo-Hoyo, Geny Catamo", torcendo para o jogador se firme no plantel principal do meu Sporting. Nas últimas décadas têm escasseado os jogadores moçambicanos no nosso clube - nos já longínquos 80s vieram Calton, um grande jogador mas então no ocaso da carreira, e Aly Hassan, um médio elegante que não teve grande sucesso. Pouco depois foi Chiquinho Conde, apenas uma fugaz época de notoriedade. E há 20 anos veio Paíto, um bom lateral-esquerdo mas que não conquistou a titularidade.
 
Agora há Catamo, um jovem no Sporting desde 2019 e que tem vindo a ser emprestado, "para rodar" como se diz na gíria. O menino cresceu e já tem 21 anos. Antes da pré-temporada foi logo anunciado como excedentário. Mas nestes jogos de preparação tem entrado e marcado. E ontem, na apresentação já em Alvalade contra o Villareal (3-0), entrou a meia-hora do fim. Jogou e encantou, atrevido, sem medo a querer mostrar que o lugar dele é ali, dono de drible mágico, lesto a escapar-se aos adversários, rijo a opor-se-lhes, levantando ovação nas bancadas. E dando golo a marcar. 
 
Geny Catamo não engana, é daqueles jogadores "alegria do povo". Espero que não o remetam para mais uma época "emprestado", num qualquer clube secundário que não lhe dê espaço para arriscar, brilhar, crescer, como antes aconteceu. Em nome de uma qualquer solidez "táctica". E que assim fique no plantel. Para que nós agora no estádio possamos gritar "Ó Rúben, mete a opção!"...*E o resto, a titularidade, ver-se-á depois...
 
(* Alusão a uma velha expressão dos benfiquistas: nos 1970s - em jogos com mais dificuldade para abrir os "ferrolhos" defensivos adversários - gritavam ao então treinador, o luso-moçambicano Mário Wilson (dito "Buda"), "Ó Buda, mete a opção!", isto para que ele fizesse jogar Jorge Gomes, o ponta-de-lança brasileiro que foi o primeiro estrangeiro a jogar por aquele clube.)

 

coz.jpg

Há alguns meses entrei num grupo-FB, o Mostra o que estás a ler..., alguém me terá convidado para isso. Fui ver. Uma cena bem porreira, despretensiosa. A ideia é simples: botar o que se está a ler, sem mais ademanes... Quando entrei o grupo tinha 20 e picos mil inscritos! Agora tem... 40 e tal mil!! (Duplo ponto de exclamação, para ira dos blasés, que há alguns anos clamavam contra esta pontuação, julgo que por causa do MEC ter botado sobre isso - não leram o Céline e querem ser "intelectuais" controleiros, é uma chatice...).

Enfim, o que é interessante naquele grupo é o que se pode apreender sobre os actuais hábitos de leitura. Até porque é uma boa amostra (os tais 40 e tal mil inscritos), e há um frenesim de publicações. A maioria lê narrativa ficcional - e muitos escritores portugueses actuais -, com gostos heterogéneos (do "romance histórico lite" a Proust, para falar do que vi hoje). Escasseia (até inexiste) a poesia, há pouquíssimas notas sobre ensaios e nunca vi referências a literatura científica. E - como sempre - ninguém refere revistas.

O grupo tem também uma outra dimensão, deliciosa, até cómica. É que no meio da enorme mole a mostrar, "na boa", o que vai lendo, o que comprou, o que amontoou, há sempre uns patuscos que sobem ao estrado e fazem prelecções sobre o "dever ser", o que se "deve ler", o que é a "boa literatura", criticando os hábitos alheios, "populares". São os "doutores" - a capacidade das pessoas serem ridículas é quase infinita. E é bom ver isso, para que um tipo não se esqueça que também a tem, a essa ridiculite, e se tente controlar...

Enfim, vem isto a propósito de eu partilhar aqui o postal que lá deixei, sobre as minhas leituras actuais:


***

Em Agosto terei (maiores) responsabilidades paternais. Por isso fui às estantes e trouxe para esta casa um punhado de receituários que me apoiem, dada a minha inaptidão ao fogão. Eu cozinho ladeado por tutoriais - sou aficionado do “Sabor Intenso” de Neuza Costa, minha líder nestas lides, e tenho o Necas de Valadares como alter ego. Visito respeitosamente os programas de Sá Pessoa e de Clara de Sousa. Mas o que alimenta as minhas frágeis tentativas culinárias é a panóplia de livros de cozinha - e aos grandes tratados prefiro estes pequenos ”de bolso”, pejados de receitas simples (e baratas). Os quais polvilho de post-its, marcando as receitas ”para mais tarde recordar”. Para este veraneio abasteci-me de uns 15, centrado em sopas, saladas e um ou outro arroz com o peixe a que possa aceder, que o fresco está pela hora da morte...

Para me dar um ar mais “culto”, de “Leitor”, acompanhei-os do delicioso ”A Viagem Dos Sabores” de Rui Rocha, uma excursão pelas mesclas gastronómicas promovidas pelas navegações portuguesas. Não cozinharei por ele mas folheá-lo-ei com deleite…

Aos membros deste grupo desejo um bom Agosto, boas férias se for o caso. Boas leituras. E, acima de tudo, bom apetite.

(Estendo aqui os votos aos visitantes deste blog)

histc3b3ria-de-portugal-capa-e-ccapa-edic3a7c3a3o-

Fiz a 4ª classe em 1974. Como tantos dos miúdos de então aprendera já a História de Portugal nesta magnífica colecção de cromos, um original de 1953 que teve múltiplas reedições até meados dos 1970s (sobre ela ver este texto). A qual bem me marcou - e no final da licenciatura ainda fiz um trabalho sobre "o Zarolho e o Maneta" indo-europeu de Dumézil na história nacional, apenas devido às memórias dos cromos.
 
Tão impressiva ficou essa memória que ainda há dias dissertei no café sobre personagens cruciais na nossa história pátria - Deuladeu Martins (também ela figura dumeziliana, se se quiser...), Geraldo Sem-Pavor, Martim Moniz, etc. -, das quais tenho como exclusiva imagem e único saber o que aprendi naquela mítica colecção.
 
Nesse mesmo dia continuei, e explanei na esplanada a súmula do meu sempre adiado ensaio imorredoiro sobre o actual regime politico português: oscilamos entre a concepção que privilegia a indução da iniciativa empresarial privada (e muito ligada à silvicultura, note-se) e a preferência por um Estado redistributivo de índole caritativa (solidário, diz-se hoje). Ou seja, mantém-se a oposição entre D. Dinis (o tal silvícola PSD) e a Rainha Santa Isabel (o PS)- cujo debate político (conhecido como "Milagre das Rosas) apenas conheço através do cromo desta colecção.
 
Dito isto, em 1974/5 entrei no então Ciclo Preparatório e tive uma excelente professora de História, Margarida Cabral. Depois, já no Ensino Secundário, os meus pais remeteram-me para a escola oficial, os "Viveiros" de então - "não quis que fosses um menino de colégio" veio-me a dizer o meu pai uns anos depois, justificando ideologicamente a aberrante decisão.... Ainda assim ainda tive dois excelentes professores de História, no 10º ano (Abílio Esteves) e 11º ano (injustamente esqueci-lhe o nome). Em todos esses anos nunca me ensinaram a História de Portugal sob o molde de uma narrativa glorificadora da Gesta Pátria, mitificando a grandeza dos Feitos Imorredoiros. Nunca! Não esqueci os cromos mas fiquei com uma outra visão do rumo nacional. Jovenzinho subi à universidade. Tive uma disciplina de História Contemporânea - com Miriam Halpern Pereira, assistida por António Costa Pinto. Líamos a própria Halpern Pereira, Valentim Alexandre, José Capela, em 1984, há 40 anos! Mitos, Grandiloquência Patriótica? Nem um laivo!
 
Uma década depois fui trabalhar para a (excelente) Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses. Nesta, grosso modo, houve duas épocas, com alguma diferença que não abissal. Sob o primeiro Comissário Vasco Graça Moura predominou uma abordagem historiográfica menos "analítica" (opto pelo termo mais "liso") e mais manuseável para a sua apresentação pública. Depois, sob o segundo Comissário, António Manuel Hespanha, e sem desprimor pela espectacularização comemorativa, privilegiou-se uma historiografia "analítica", mais problematizadora dos processos históricos - um rumo que foi continuado pelo terceiro Comissário Joaquim Romero de Magalhães. É justo dizer que nessa década e meia não se enfatizou a vertente do escravismo, mas ela não foi apagada. E que bastantes investigações foram apoiadas e/ou publicadas, com vasta disseminação. Mas mais ainda: nesta semana andei a limpar velhos dossiers e redescobri uma luminosa conferência do Hespanha, "As narrativas da interculturalidade", de Março de 1997. Não posso precisar se foi proferida em Lisboa ou em Maputo, mas nessas breves 8 páginas ele problematizava as questões fundamentais da história da expansão portuguesa, das formas de a analisarmos actualmente e a necessidade de sobre elas reflectirmos em termos de política, interna e externa. E o homem era o Comissário-Geral das Comemorações dos Descobrimentos Portugueses...
 
Depois fui 18 anos para Moçambique e não andei propriamente a ler a história pós-medieval portuguesa. Entretanto a minha filha fez o "liceu" no estrangeiro e assim não conheci os actuais livros escolares portugueses. Mas não acredito que - apesar da consabida influência da intelectualidade do PS - o ensino da História tenha regredido até aos modos patrioteiros colonialistas dos tempos do Ultimatum e da I República. Ou do Estado Novo...
 
Todas estas memórias (aborrecidas, os velhos inutilizados têm a mania de chatear os outros com os seus passados, coisas de "has been...") vêm-me a propósito das constantes publicações na imprensa sobre a necessidade de "trazer a lume" a "Escravatura" portuguesa, de "descolonizar a história de Portugal", de nisso afrontar o "racismo sistémico, estrutural" que polui os portugueses, qual necrose das suas almas. Todos eles clamam que a história portuguesa se reduz a um rosário de malevolências e que nada disso tem sido dito, na academia, no ensino, na sociedade. São falsários. Alguns são militantes políticos ("activistas", diz-se agora) demagógicos. Outros são académicos falsários, o que é muito mais grave. Alguns outros são apenas jornalistas, e como tal não precisam de adjectivos desqualificativos.
 
O outro dia vi uma reportagem da SIC, anunciada com a habitual pompa e "gravitas" por Rodrigo Guedes de Carvalho, chamada "Pretérito Imperfeito". Uma patetice pegada... Entre a colecção de dislates - e disso eximo o actual ministro da Cultura, ali respondendo com bom senso às patacoadas da repórter - saliento uma investigadora de Coimbra. Analisando os "manuais escolares" denunciava, com veemência, o facto de ser ensinado que os portugueses comerciavam "especiarias, marfim e escravos". E que não se diz, reclamava, "pessoas escravizadas". Ou seja, para esta intelectual "abissal" se eu conseguisse arranjar um lugar de professor de História (o ensino do secundário está vedado aos antropólogos, talvez por a corporação andar há décadas entretida nestas maluquices ideológicas e descurar o rumo profissional dos licenciados), eu deveria ensinar aos petizes que o comércio na era das navegações se centrava em "pessoas escravizadas", "marfim animal" e "especiarias vegetais". Caso contrário as pobres crianças (uns "monstros", como disse um psicanalista célebre) não compreenderão...
 
E entretanto todas as semanas é publicada mais uma atoarda destas - no "Público", no "Expresso", nas televisões. Nisso pulula um conjunto de "activistas", entre performers, artistas, jornalistas, académicos, e entre estes vários antropólogos - desses que vão pisar os brasões municipais na Praça do Império mas que nem percebem que a avenida que sobe até ao "Humberto Delgado" (nome que apreciam) se chama Avenida (da Conferência) de Berlim, ignorância irreflectida e apenas festiva que bem justifica que lhe troquem os nomes na tv... -, um conjunto aparentemente avantajado de gente que vai botando textos desabridos e falsários. Pejados de jargão, anunciam um malvado ensino da História e uma concepção de Portugal que não é real.
 
E há meia dúzia de tipos que lhes vão respondendo, com o saber e o talento de cada um. Mas que nisso apenas incrementam o eco destes dislates. Agora vejo que saiu uma pomposa "declaração do Porto", vinda desses "activistas" - deve ter saído de uma actividade artístico-política que ocorreu quando estive nessa cidade há semanas. É um documentozito esquerdalho, uma "sobrevivência" dos tempos m-l, quais ressureições das FEC (m-l), PSR, PCP (R) e quejandas organizações revolucionárias. Dizendo-se contra o colonialismo e o racismo, ditos vigentes, o sumo das reclamações é uma discursata mal amanhada contra o capitalismo.
 
E tal como o país nada ligou a esses grupelhos nos 70s e 80s, bem que se podia fazer o mesmo a estes seus demagógicos descendentes. Haverá entre eles uma ou outra alma bem intencionada, pulularão intelectuais humanamente em busca de militâncias que propiciem tardias erecções. Mas de facto é uma tralha. "Aldrabística"...

ghorwane_1_970_2500.jpg

Telefona-me um velho amigo, também ele torna-viagem, a desafiar "embora a Sines ver os Ghorwane?!!". "Arranja lá um carro, vá", eu resmungo, os custos - decerto que desabridos -, a falta de energia, tenho lá eu estaleca para ir a um festival, que canseira, aquilo carregado de gente, barulhenta e - pior do que tudo - jovem ("então não foste à Colômbia, Andes acima Andes abaixo?!", poderia ele ter ripostado mas não o fez), "não tenho carro" resolvo eu com a verdade, e acrescento, só por segurança, "e onde dormiríamos?" e o sacana, feito puto, "dorme-se na praia" e avança "eu levo a garrafa de tequilla" - e até já me estou a ver exausto na areia da alvorada, depois de dois ou três Red Bull a beber tequilla pelo gargalo. Rust Never Sleeps, defendo-me ainda, entrincheirado geronte e o tipo faz o ataque final: "não tens uma amiga que nos leve?", provocador no seu remanso conjugal, como se estivesse eu (e ele) nos anos 80s, e alguém ainda me aturasse o suficiente para uma estafa destas...
 
Praguejo, raisparta, o tipo a lembrar-me, mostrar-me, o velho que estou, acomodado. Passa um dia. E estou aqui a matutar. Então vou, vamos, perder os "Bons Rapazes"? Os Ghorwane aqui tão perto, a Sul do Sado...? Camioneta e dormimos na praia, N.? Trazes a tequilla?
 

Pág. 1/3

Gerente

Arquivo

  1. 2023
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2022
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2021
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2020
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2019
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2018
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2017
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2016
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  1. 2015
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Contador

Em destaque no SAPO Blogs
pub