Às oito e um quarto soou o apito inicial. Logo nos primeiros minutos houve uma oferta da defesa do Moreirense e o Sporting inaugurou o marcador. Bons augúrios. Pois se é certo que o Sporting está pujante - há 50 anos que nenhuma equipa marcava tantos golos, é evidente que o jogo flui, nisso Trincão reassumiu-se, e também o jovem Quaresma recuperou o estatuto de "muito prometedor", o sueco avançado é um verdadeiro achado, o médio dinamarquês é bem mais do que se esperava, Gonçalo Inácio está soberbo, o "nosso" Catamo pegou de estaca, Adan não está como no ano passado ... -, o Moreirense vem fazendo um bom campeonato e sempre se teme uma escorregadela em qualquer "terreno difícil". Ainda por cima porque o malvado Benfica também está forte, com avantajada panóplia de recursos. Enfim, cinco minutos estavam decorridos e o sempre difícil primeiro golo estava alcançado, a repousar a equipa, assim mais disponível para explanar o seu jogo. E nos minutos seguintes viu-se que estava mandona, ciosa de si, empurrando os de Moreira de Cónegos para o seu último reduto, com pressão alta, muita posse de bola num jeito quase turbilhão. A sossegar o adepto no sofá, tão esperançoso nisto do "este ano é que é". Apesar do tal Benfica...
Por tudo isto às 8.30 passo o canal para a outra peleja, o combate, perdão, o debate entre o capitão do PSD, perdão, AD e o capitão do PS. Para "Meia-hora" daquilo, "Vê-se o debate, que demora a primeira parte do jogo e depois volta-se, até durante o intervalo". Entretanto telefonara-me um amigo sportinguista, mesmo já durante o jogo, por coisas cá nossas, e anunciara-me estar o Capitólio cercado por polícias arruad(c)eiros.
Chego ao evento e deparo-me com algo diferente do que esperava, quase um Super Bowl politiquês. Haviam-se congregado as três estações televisivas generalistas, num verdadeiro espavento, deslocadas para o tal "Pavilhão dos Debates" e o embate previsto para uma duração de uma hora, afinal! Ou seja, a de serviço público e as outras com alvará público para emitirem, delineam um modelo de debate eleitoral que reestabelece o velho primado da "bipolarização", como se esta uma realidade virtuosa, esse aldrabismo que os fazedores de opinião propalavam há décadas. Consagrando - e nisso reproduzindo - um "estatuto preferencial" para o PSD e para o PS. Como se isso seja uma realidade "natural", geológica até, e assim autojustificada.
A árbitra Clara de Sousa fez soar o apito inicial e logo Montenegro, campeão da sua causa, foi ao tapete. Pois perguntado sobre o que pensava daquela policiesca ululante que os circundava mostrou-se para com ela muito compreensivo, fazendo nisso lembrar António Guterres titubeante, e de lesto passo atrás, diante da arruada dos produtores de vinho, nesse então dispostos ali ao Terreiro do Paço reclamando contra a redução da taxa de álcool permitida aos condutores. O que lhe valeu um KO técnico, como estarão recordados alguns dos mais antigos... Logo, lesto, Santos assumiu-se como vigoroso estadista, situando que há limites no entre as "quatro linhas" da democracia, rijo num que "não se governa sob pressão", no fundo reclamando ordem unida à polícia. E nisso fez lance de três pontos, como no basquete. Depois seguiram-se 55 minutos de "você lá, você cá", entre chutos para a frente com previsões económicas salvíficas, futebol de praia sobre promessas aos "jovens" para que estes não emigrem, e um catenaccio ríspido dedicado aos pensionistas ("como reformar um país em que os governos tanto dependem dos velhos eleitores?", mastiguei eu enquanto me servia do pacote de vinho, um decente Palmela a preço apetitosíssimo).
Disso tudo ficou-me na retina uma bela ida à linha, seguida de cruzamento bem medido, em que Santos proclamou que com ele não se patinaria, ao contrário dos anteriores governos socialistas - nisso invectivando os modelos de jogo instaurados pelos antigos treinadores Costa, Sócrates e, decerto, Guterres. Assim como se proclamando "eu sou o Rúben Amorim do PS". E entretanto prometeu que nos próximos tempos o seu partido iria estudar as "áreas económicas estratégicas" para as quais será dirigido o investimento público. Assim recordando-nos que o PS está, grosso modo, no poder há trinta anos e, ainda mais, de modo seguido nos últimos oito - nos quais ele próprio governou, ao que parece um pouco a contragosto. E que nesses longos períodos não conseguiu descobrir quais as tais "áreas estratégicas" preferenciais. Do outro lado Montenegro optou pelo jogo de repelões, com algumas entradas duras, para meter o adversário em respeito, num arcaboiço técnico que me lembrou o seu (quase) conterrâneo Paulinho Santos. Ou, para ser mais actual, o geniquento e bem sucedido molde táctico-comunicacional do nortenho Sérgio Conceição.
Tudo aquilo demorou - o tal desplante das estações televisivas - e terminou já a meio da segunda parte do confronto de Moreira de Cónegos, tendo encontrado o Sporting a ganhar por 2-0, e decorrendo o jogo em modo modorrento. "Este ano é que é", para o Sporting? A ver vamos, que será bem bonito se tal for. Depois caí à cama.
Hoje, na alvorada, "busco" notícias sobre o embate do Capitólio. Os comentadores dão notas aos contendores, como se tudo aquilo integrasse o velho Prémio Somelos-Helanca do "A Bola", quando o jornal existia. Os tipos do Sporting dizem que o Sporting ganhou, os tipos do Benfica dizem que o Benfica ganhou. Os tipos do Porto estão calados. E ainda não há notícias sobre as punições aos polícias que invocaram "doença" para faltarem ao Famalicão-Sporting. Nem sobre o despedimento dos médicos que lhes passaram os atestados médicos fraudulentos.
Para a semana vamos a Vila do Conde, mais um "campo difícil", o sempre codicioso Rio Ave. Lá para Março votar-se-á.
(Postal para o Delito de Opinião)