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Sem título e... com que texto? Posso compreender os eleitores norte-americanos, decidiram em função das suas considerações sobre o seu país. Mas que posso eu dizer sobre os doutores portugueses que ronronam com isto, que dão largas a interpretações refinadas - transaccionalismo e coisas quejandas - sobre isto? A minha querida irmã ausentou-se por uns dias. Mas deixou instruções explícitas à minha querida filha - que dentro de dias se ausentará - para que ela mantenha a guarda durante a sua ausência: "não deixes o teu pai escarrapachar nos blogs o que pensa desses doutores trumpófilos. Por mais razão que ele tenha! Mesmo nesses palavrões que só ele conhece...".
(A fotografia retrata uma exposição da Magma Fotografia, na estação dos CFM de Maputo, em 2009. A fotografia exposta será de Solange dos Santos ou de Dominique Andereggen, não tenho a referência completa)
"Zé / Zezé, então e como é que está aquilo em Moçambique?...", perguntam-me diariamente amigos, agora que "as coisas" de lá se afastaram um pouco dos "escaparates" da imprensa. - escrevia eu há um mês. Agora perguntam-me menos, as notícias por cá escasseiam e outras questões prementes convocam o interesse: as nossas inúmeras trapalhadas do CHEGA, às quais se seguiram as previsíveis de Montenegro. Lá fora mantém-se a desgraça de Gaza, acoplada ao patético/pateta anseio de uma Riviera ali medrada. E, agora mesmo, a ascensão final da Criatura TrumPutin. Esta tanto animando essa execrável mescla, vigente desde a invasão da Ucrânia, fez ontem três anos (!), dos nossos comunistas - das versões III e IV Internacionais - e fascistas - entre estes em especial os que estiveram estas décadas travestidos de "sociais-democratas" pêessedistas ou "demo-cristãos". Os quais andam agora, eufóricos pois "saídos do armário", quais "bichas loucas" em histriónica "parata fascista".
Enfim, olhando a História, percebemos que a revivemos. Pois a oriente temos hordas de guerreiros norte-coreanos rumo a Viena, os boiardos russos vão sendo defenestrados em massa, o pretendente Navalny foi morto há um ano (cumpriu-se há pouco). Entretanto, a oeste Drake vagueia pelas nossas costas, reforçado por frota de mercenários vikings, convertidos ao calvinismo africano. E há dias, arrogante, mandou-nos como emissário um puritano de Salem, para exigir "tributo". E esta nossa gentalha rejubila. Porquê? Por não gostar que "Roma" imponha alguns limites às superstições locais... São uns labregos, já o referi.
Neste ambiente como atentar nas coisas de Moçambique? Mesmo assim ainda há quem me pergunte novidades sobre o país. Faço então um curto resumo, para não cansar os (um pouco) interessados. O candidato presidencial Venâncio Mondlane, autoproclamado "presidente do povo", continua as suas sortidas, colhendo impressionantes e espontâneos banhos de multidão: agora em Vilanculos, há dias em zonas populares de Maputo e em localidades da sulista província de Gaza (a Gaza moçambicana, não a mediterrânica, como julgou o ex-viking Musk). Alguns dos seus seguidores mais próximos continuam a sofrer tentativas de assassinato, ditos como praticadas pelos consabidos "esquadrões da morte". A isso reage a população, destruindo algumas instalações estatais e do partido do poder, fenómenos mais correntes no Sul do país, algo relevante pois em zonas de tradicional adesão maioritária ao Frelimo. E continuam a grassar bloqueios rodoviários e em torno de zonas comerciais, sinalizando a imprevisibilidade do rumo nacional e a atrapalhação da "ordem pública". Como detalhe, verdadeira minudência, lembro que algumas rádios de Nampula viram-se impedidas de transmitir, tendo regressado algum tempo depois, decerto que tendo tomado em conta o "aviso à navegação" recebido. Bastante preocupantes são as notícias da disseminação de grupos amotinados (agora ditos "namparamas", num uso inovador do termo, que vem substituir as anteriores denominações "bandidos armados" ou "insurgentes"), os quais alastram, principalmente nos distritos da Zambézia. E diante dessa epidemia de "jacqueries" temo que se venha a tornar em pandemia.
Entretanto há dias houve a ansiada reunião do Comité Central do Frelimo, sobre a qual muitos diziam ser o momento da passagem do testemunho, efectivando uma maior autonomia política do actual presidente Chapo, abrindo assim o "novo ciclo" de poder - este por cá já há tempos "anunciado na tv" pelos comentadores lóbistas Paulo Portas e Miguel Relvas -, e concomitantes novas práticas de exercício governativo.
E alguns dias após essa reunião magna houve pronunciamentos dos próceres moçambicanos, delineando o conteúdo desse "novo ciclo". O antigo presidente Guebuza deu uma conferência na semana passada, explicitando que "o colono trouxe a ideia que o africano é corrupto". Entenda-se, que a premente acusação de corrupção generalizada do regime se deve ... à maldade exploratória dos colonialistas. Para os alheados das questões moçambicanas (e africanas) esta formulação tem de ser esmiuçada, pois não é apenas uma diatribe. As elites políticas que ascenderam ao poder após as independências sempre se legitimaram pelo seu papel anticolonial. E o Frelimo sempre insistiu nesse tópico. Agora, 50 anos depois da independência, com o país naquele estado, face a uma população cuja esmagadora maioria tem menos de 35 anos - netos e bisnetos dos colonizados -, tentar insistir neste tópico (certeiro ou errado, pouco importa) é evidência de que a elite política (na qual Guebuza é importantíssimo) não compreende o real, não reflecte sobre ele. E assim nunca assumirá um qualquer "novo ciclo" (apesar do que por cá dizem os comentadores televisivos Miguel Relvas e Paulo Portas...).
Logo de seguida o novo presidente Chapo foi mais longe no sistematizar do conteúdo desse "novo ciclo": primeiro que a luta contra as "manifestações é a continuidade da guerra dos 16 anos". A expressão é um programa político: por um lado, o epíteto "guerra dos 16 anos" é um lema dos frelimistas (ladeado por outro "título", o de "conflito armado"), que nega a referência a uma "guerra civil", forma de então - e ainda agora - negar a realidade social da Renamo, reduzindo-a a marioneta de agressão estrangeira. E, por arrasto, afixando essa "inexistência" ao que se passa agora. Por outro lado, Chapo - mais novo que Guebuza - ao afirmar isto não só procura reduzir os manifestantes a agressores (externos) como busca a legitimação do poder na invocação da pacificação de uma guerra terminada há... 30 anos. E um discurso autolegitimador que, como o anterior, não colhe diante desta pirâmide etária. Ou seja, tanto pela negação sociológica como pela retórica autolegitimadora, a via do actual presidente sublinha que a elite política - e nesta caso a das fracções vigentes - não compreende o real, não reflecte sobre ele. E assim, repito, nunca assumirá um qualquer "novo ciclo"...
Depois, e para que não restem dúvidas sobre as suas intenções e as do poder instituído, foi a Pemba discursar e anunciou ontem que "Vamos derramar sangue para combater as manifestações", enfatizando ainda que "vamos fazer jorrar sangue"...
Enfim, "Zé/Zezé, então e como está aquilo em Moçambique?...", perguntam-me os amigos, diante da imperial do fim da tarde. "Não sei", respondo, entristecido. E aduzo, "tens de ir ouvir o Miguel Relvas. Ou o Paulo Portas. Ou o "senhor embaixador" Martins da Cruz"... ". Os amigos riem-se, solidários, juntam-lhe "Devias-te ter safo na vida, Zezé!!". E juntam, "vamos lá jantar ao Cabeça do Toiro" ou "à Flor do Minho". E come-se uma "crise", batatas fritas com ovo estrelado, ou, vá lá, uma meia dose de febras grelhadas.... Manjares de... não-lóbistas.
(Muitos continuam a resmungar que "não se lê", versão habitual do "tudo está perdido", chegámos "ao fim do mundo", etc., tudo também muito devido às "redes sociais". Enfim, cada cabeça sua sentença. Entretanto no Facebook estou num grupo - maioritariamente português - de leitores, o "Mostra o que estás a ler...", que conta já mais de 100 000 inscritos (!), numa actividade fervilhante dessa demonstração do que se lê. De vez em quando vou lá e deixo nota do que vou lendo. Hoje deixei esta nota das minhas leituras em curso):
Apeteceu-me reler "Lavoura Arcaica" de Raduan Nassar (Relógio d'Água), um livro de que gosto imenso - poderá ser visto como uma invocação da figura do "filho pródigo", uma visão sobre a vivência da repressão (familiar, social), um discurso sobre o autocontrole, e até etc. Eu vejo-o como uma belíssima narrativa, e Nassar é um dos meus escritores favoritos.
Estou a ler um livro de um dos meus avôs, "O Segredo do Major Thompson" de Pierre Daninos (Clássica Editora). Há cerca de 40 anos lera um antecedente, "Os Cadernos do Major Thompson" - e estou agora a gostar mais do que a memória que tenho do primeiro, talvez efeitos da minha idade, tornando-me mais ... pausado. Daninos era francês, escreve num rumo tipo André Maurois, e teve na época um enorme sucesso. São pequenas crónicas humorísticas, de uma ironia fina (e mansa, também), despretenciosa, jogando com os estereótipos nacionais. A sua criatura, o inglês Major Thompson vive em França, casado com uma francesa, e elabora sobre as características típicas dos franceses. Neste livro vai à Grã-Bretanha em familia e com amigos, e um destes, "Danainos" ele-próprio, elabora sobre as exdrúxulas características que encontra nos ingleses. É uma leitura muito simpática.
Nesta época convulsa (não o são todas?) está-me a ser útil, e prazerosa - ainda que não goste do profético título -, a leitura do "O Poder da Geografia: 10 Mapas que Revelam o Futuro do Mundo", de Tim Marshall (Desassossego). Tem uma escrita cristalina e apresenta em poucas (e sábias) páginas os contextos políticos, seus conflitos e os antecedentes destes, de regiões cruciais na cena internacional. Comecei por um trio de capítulos (Irão, Arábia Saudita, Turquia), seguirei para os dedicados à Etiópia e ao Sael, deixarei para depois os do Reino Unido e Espanha, e terminarei com a Austrália. E vou aprendendo imenso.
Esta semana deram-me o "Viagem de Inverno" de Maria Filomena Mónica (Relógio d'Água), e já quase o terminei. É uma colecção de pequenos textos de opinião e algumas crónicas, publicados na imprensa nas últimas duas décadas, todos com 2 ou 3 páginas. Arrumados por tópicos, os primeiros sobre o estado da nossa sociedade, depois como vai o país, o regime político, por aí afora. Estou a gostar muito, concorde-se ou não com as opiniões da autora, são textos cristalinos, uma espécie de tratado de Bom Senso, na abordagem a questões do nosso país. E não só...
Emprestaram-me este "A Década Prodigiosa: Crescer em Portugal nos Anos 80", de Pedro Boucherie Mendes. É uma calhamaço (650 páginas), e só o terminarei daqui a uns tempos. Mas lê-se bem, escrita escorreita. E o tema é bem adequado às leituras da gente da minha geração. Para além disso o livro está bem conseguido (ou pelo menos assim me parece, vou a 1/5 da leitura), o autor congregou bem os detalhes - e os processos - que fizeram daqueles tempos uma era tão interessante. E inovadora, em Portugal.
Vou lendo o "Se Tivesse Sido Eu a Inventar Deus" de Afonso Melo (Âncora). O autor é um belíssimo cronista, e nisso não facilita. Tornando a leitura um repasto, delicioso. Antigo jornalista desportivo, romancista, culto, cada crónica é uma navegação, cruzando marés desde as da sua intimidade, passando pelo seu enciclopédico conhecimento desportivo - em especial futebolístico - sabedoria literária, esse de evidente grande leitor, ironia, até sarcasmo, tudo vivido sob uma angústia, até heróica. E isso argamassado num diálogo constante que não se apregoa erudito. Mas é mesmo o gosto de ser, que nos dá um imenso gosto de ler - devagar.
E, mergulhando na actualidade mais premente, comecei há dias outro calhamaço, "O Fim do Homem Soviético: Um Tempo de Desencanto", de Svetlana Aleksievitch (Porto Editora), a Nobel de Literatura que neste livro faz um cru relato do que foi a Rússia soviética.
Enfim, votos de boas leituras aos que por aqui passarem...
Uma amiga chega ao café do bairro e dá-me este "Viagem de Inverno" (Relógio d'Água, 2024), de Maria Filomena Mónica, acompanhado de um - até displicente - "passei ali pela Bertrand e achei que gostarias deste...". Eu angustio-me num "mais um livro!", a somar à cordilheira doméstica da minha dívida de leituras. Sei que este me chega às mãos por efeito de algumas conversas naquela mesma esplanada onde a autora também foi tema - há meses li-lhe com agrado a biografia de Eça de Queirós, entre outras coisas. Beijo a querida amiga, e generosa - e é-o muito para além da oferta do livro...
À noite avanço, devagar, no livro, pequenos textos de opinião e algumas crónicas, publicados na imprensa nas últimas duas décadas, todos com 2 ou 3 páginas. Arrumados por tópicos, os primeiros sobre o estado da nossa sociedade, depois como vai o país, o regime político, por aí afora. Sorrio, face ao pertinente cristalino do que vou lendo. Não que concorde com tudo o que ali está, claro - em especial franzo o cenho diante do apreço pela círculos eleitorais uninominais que M.F.M., demasiado britanófila, defende. Mas mesmo assim sigo agradado com a incisiva inteligência, suavemente apresentada, como se "deixada cair". Tanto que digo para a almofada - e presumo que se a autora viesse a ouvir isso decerto se abespinharia - "isto devia ser o manual daquela disciplina de Educação para a Cidadania", essa mesmo que põe uns punhados de tontos a espumar...
Mais para a frente leio, e de novo sorrio face à inteligência alheia, clarividente de nada bombástica: "Vivo em paz com a banalidade da vida democrática. Não preciso de utopias nem considero que exista uma crise de valores" (81-82).
E chego ainda este trecho, que desconhecia, uma pérola mesmo: "Sinto-me mais afastada da gente que, em 1789, se sentou ao lado esquerdo da Assembleia Nacional reunida em Paris do que de J. S. Mill que, em 31 de Maio de 1866, virando-se para os Tories, disse no Parlamento britânico: "Não quis dizer que os Conservadores sejam geralmente estúpidos; o que pretendi afirmar foi que as pessoas estúpidas são geralmente conservadoras". (88).
E logo me lembro destes "estúpidos", imensamente estúpidos, que por ora peroram, entusiasmados com Trump, Vance, Musk... Fecho o livro, apago a luz. E durmo. Hoje lerei o resto.
Há anos que no Facebook me vai acontecendo isto: recebo vários convites de "amizade" (ligação) enviados por mulheres muito jovens. Moçambicanas, mais habituais, e portuguesas, mais raros. Têm alguns pontos comuns, outros distintos. Provêm de perfis com poucas ligações ("amigos"), sempre só homens. Os perfis das moçambicanas são reais, percebe-se pelas fotografias e pelos dados apostos, usualmente ... até ingénuos. Os perfis das portuguesas parecem falsos, intui-se pelos dados apostos, usualmente repetitivos e querendo-se ... misteriosos.
Mas há outra diferença significativa. As miúdas moçambicanas surgem em cândidas poses provocatórias (mas nada porno...). São sempre bojudas, fotografam-se (selfiezam-se) nas ancas largas e mamas fartas. Reina o valor estético "gordura é formosura", qual apelo à gulodice alheia. As (hipotéticas) miúdas portuguesas surgem esguias, e fotografadas como contidas, nada demais mostrando, como se contendo o "charme discreto da burguesia", assim convocando as delongas do saborear.
Vou recusando os convites. Não por menosprezo. Apenas porque continuo esperançoso, aguardando pela Pandora. Sei que se recusou o Corto dificilmente olhará para mim, mero Rasputine. Mas, ainda assim, aguardo...
Vários amigos me contactam, indagando sobre o meu estado após o "terramoto" (é o que consta) em Lisboa. Agradeço a preocupação mas sinto-me um pouco desiludido. Pois percebo que gente que me é próxima não atenta no facto consabido: sou inabalável!
AZ Alkmaar - 3 (2) x Sporting - 2 (1) (AP) de 2004/2005, TU - 1/2 Final - 2ª Mão
Há dois anos fui a Norte, aboletei-me em maravilhosa quinta de querida amiga, ali nas cercanias do Sousa. Nesses dias tive o privilégio (verdadeiro) de ser visitado por amigos sitos nesse acima-do-Trancão. Foi a última vez que vi o Jorge, um delicioso amigo feito na Ilha de Moçambique - com o qual nunca tive, geografia a isso obrigou, grande convívio mas ao qual me unia uma enorme empatia, que quero crer fosse recíproca. O Jorge - que morreu dois ou três meses depois, não sem antes me ter enviado uma mensagem audio, que recebi em Bogotá, a resmungar comigo devido ao meu "direitismo" exarcebado, e a qual não consigo apagar do meu telefone - já estava muito doente mas ainda assim meteu-se ao volante e foi até lá, junto a Paredes. Também foram a Cristina e o Rui, este apareceu um bocado manco, dado a lesão que o acometeu, queridos amigos feitos em Maputo. Foi para mim, neste abandono em que às vezes, demasiadas, me sinto, um dia delicioso. Sentámo-nos a tasquinhar na varanda, com a frugalidade que era, evidentemente, necessária. E falámos da vida que fora.
Às tantas eu contei (mais) uma memória, convocando a gargalhada geral, daquelas até às lágrimas. Pois lembrei este jogo do Sporting com o AZ67, meias-finais da Taça UEFA, há já 20 anos. O qual vi num ecrã gigante na esplanada do "Eagles", na baixa de Maputo, em mesa apinhada. Na qual estava o Rui, claro. E também o Nuno, e a este convoquei então para mandar calar um pateta benfiquista que ali nos azucrinava porque perdíamos a peleja, e eu (que a última vez que me bati com alguém deveria ter 11 ou 12 anos) já estava pronto para a porrada... E no final do jogo, aos 120 minutos - final do prolongamento, já em desespero -, num canto em que até o guarda-redes Ricardo "foi lá à frente" o Sporting marcou, por Miguel Garcia, o lendário golo que o levou à final da Taça (aos 8'15'' do filme). E eu, nos então meus 90 e tal quilos, logo me encontrei, exultante, histérico, ao colo do Rui, ele um pouco maior do que eu, e ambos (ele garboso heterotóxico militante, eu também heterotóxico mas mais onírico) abraçados de beijos na boca - sem língua, sem língua....!!! -, tamanha a felicidade sentida! O que o Jorge se ria, o que se ria a Cristina, o que também se ria o Rui (ainda que tentando negar...), o que me ria eu, com tal memória!
É a bola. O futebol. A suspensão do resto. Enquanto ela rola, os "nossos" jogam.
Mas isso não justifica, nada justifica, que nos suspendamos nos restantes dias, sempre! Que sigamos despojados dos nossos critérios. Um simpático interlocutor veio agora ao meu mural FB exigir-me "elevação" por ter eu resmungado diante do inaceitável coro de elogios ao defunto Pinto da Costa. Por aí afora há imensos encómios ao indivíduo e também apelos desse tipo, o "respeito pela família", "pelos amigos"- como se a família não conhecesse o seu patrono e dele, e de tudo aquilo, vivesse. Como se os amigos (general Eanes, incluído, para mal dos nossos pecados) não fossem adeptos daquilo, miseráveis coniventes. E clientes, quantas vezes.
Vejo agora que o jornal "A Bola" noticia ter o Portimonense jogado hoje com o nome de Pinto da Costa nas camisolas, e que a equipa o homenageou antes do jogo que fez. E logo me lembrei de outro episódio: há cerca de 30 anos Rui Nabeiro decidiu financiar o Campomaiorense no futebol, e entregou a tarefa a um filho. O clube ascendeu à I divisão durante uns anos. Apesar do patrocínio, decerto que generoso, era um clube modesto, plantéis modestos, jogadores modestos - desses que não ganham milhões, que chegados aos 30s avançam para a II ou III divisão, disso seguem para alguns empregos não especializados. Depois uns prosseguem a sua vida, com memórias feitas, outras atrapalhar-se-ão. Um dia num jogo Campomaiorense-Porto houve sururu, e um dos modestos jogadores de Campomaior, ali a fazer pela vida (o prémio de jogo, a ansiar pela manutenção na I divisão, nisso a renovação do contratozeco), foi expulso. Cá fora contou o que acontecera, uma mariolice qualquer (mais uma) do árbitro e ele a protestar. E o guarda-redes do Porto, esse Vitor Baía que viria a seguir até ao fim com Pinto da Costa, a gozá-lo, com sarcasmo, "cala-te, ou vais para a III divisão como o Portimonense" - como fora este clube, remetido por Pinto da Costa pois se indispusera com o seu presidente, o pato-bravo local Manuel João (julgo), que tendia para o Benfica... E o pobre (modesto) do Campomaiorense irritou-se, foi expulso.
E é esta elevação, estas "condolências", que convocam. O respeito pela corrupção, pela violência (eu lembro-me do sexagenário - ou já septuagenário - Carlos Pinhão a ser agredido em Aveiro pelos homens de Pinto da Costa), pela falsificação. Querem o respeito pelo malvado princípio "o que importa é ganhar, seja lá como for". O homem foi um escroque imundo, corruptor da sociedade portuguesa. A agora chorosa família sabia-o perfeitamente e disso fruiu, e muito. Os amigos também ... o são. "Elevação"? Como diria o Boris Vian, se vivesse nestes tempos, "hei-de escarrar no teu forno"! E nos dos adeptos de tais modos...
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