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Nenhures

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O meu pai, António Pimentel, faria hoje (21.4) 100 anos. Se cá estivesse resmungaria comigo "Zé, vê lá bem se ainda tens idade para isto", este descer o raudal (pode ser "rápidos") do Guayabero e todas as outras caminhadas, mata acima, mata abaixo. Mas também é verdade que ele está cá, agora mesmo já centenário, eu a acumular histórias desta zona de guerrilhas e paramilitares, ditadores fascistas ou quejandos e resistências camponesas, indução do plantio de drogas por gringos e estes mesmos a combaterem-nas. E, mais do que tudo, de desflorestação e de índios devastados. Isto para lhe contar d(est)as maleitas do mundo. Enfim, tenho de comprar um bom rum para lhe levar daqui e com ele falar disto tudo.

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Enorme, a sinuosa fila do controlo de documentação. Estou bem, esta barba rapada, mochila nas costas, sinto-me com o vigor de um Haddock nos Andes, a pertinência de um Mortimer na Atlântida, a “resiliência” - como agora se deve dizer - de um Jonathan nos Himalaias, a rudeza de um Mike Blueberry nas Montanhas Rochosas, a destreza de Buddy em escarpas e planuras, o encanto frágil de Corto em Mu. E até mesmo dono da verve lesta e ferina de Achille Talon. Uma funcionária, uniformizada e com a estrita beleza da sua ainda juventude, avança para mim "Que idade tens?". "Para que queres saber a minha idade?", respondo-lhe na minha língua, ela insiste e eu repito-lhe a negação, num afrontado “mas porquê?”. Mas ela impõe-se, “diz-ma, vá!”. Rendo-me e digo-lha, ela nem sorri no seu ir-se embora, e naquele seu primeiro passo atiro-lhe “nunca mais virei ao teu país!”. O tipo da minha frente ri-se, percebe-me a língua e a angústia, “brasileiro?” pergunta-me em modo solidário e diz-se mexicano, ainda que pareça um baneane de I’bane. Forço-me à meia dúzia de palavras trocadas, aspirando aquele ânimo que ele me oferece. Pois desmascarado afinal Steiner que fui…

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Estou no "check-in" do aeroporto na Portela de Sacavém (ao qual puseram o nome de um militar hitleriano). Uma bicha enorme e imóvel. Não quero ler os jornais desportivos, devido ao meu Sporting. Por isso acorro ao meu WhatsApp: um primo enviou-me uma foto do Marcelo na mesquita a fingir que reza! Fujo dali. Chego ao FB: nos murais da imprensa loas à artista doutorada que "descobriu Fanon", obituário do fotógrafo que "descobriu a beleza dos corpos negros" (!). Meu palavrão matinal e olhos em alvo. E são estes, porque assim, que notam as 2 grandes pinturas publicitárias que monopolizam a sala: em Lisboa a Vodafone coloca uns dizeres ingleses que mimetizam a já velha campanha de Obama. E coloca 7 retratos: um amoroso jovem casal (de negros), um amoroso pai com seu radiante filho às cavalitas (negros), um amoroso casal de reformados (que no Brasil serão ditos "pardos", sob algum apoio de acção afirmativa, e daí o seu ar feliz, recompensado, apesar da idade e evidentes achaques). E um branco - o retrato de Pistorius, o assassino sul-africano! 

E este asco passa. Neste ambiente intelectualmente patético até será elogiado. Murmuro mais uns palavrões. A ver se a bicha anda, para que possa intervalar disto.

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(Fotografia de Miguel Valle de Figueiredo)

Ontem, 13 de Março, passaram-se 3 anos exactos!: a minha filha chegou de Inglaterra, onde a sua universidade encerrava por todo aquele ano lectivo, eu recebi-a num misto de angústia - aquela que presumo todos os pais terem sentido nessa época, ainda desconhecedores dos efeitos que a nova doença teria entre os jovens - e de ira, pois acolhendo-a num aeroporto pejado de turistas ingleses que vinham ao Sol do Algarve, e sabendo que os paquetes apinhados ainda atracavam ao Tejo..., isto tudo entre as já trapalhadas da futura "Super-Marta" (que agora se anuncia "para Lisboa"!), sua dra. Graça ("visitai os lares de terceira idade", clamara ela nessa mesma semana) e restantes dignitários... Saímos da Portela logo rumo a Sul do Tejo, e confinámo-nos junto a um grupo de amigos que já se tinham encerrado há já uma semana, abrindo o portão apenas para que nós entrássemos - Amigos-Irmãos, verdadeiramente.
 
 
 

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"On the road", esta assim encrespada, enquanto na rádio o velho Slowhand entoa a lendária "Wonderful Tonight", aquela do fantástico meneio "and the wonder of it all / Is that you just don't realize how much I love you". Depois, meter a primeira e avante...!, sacudindo o vislumbre do passado.

Eric Clapton - Wonderful Tonight [Official Live In San Diego]

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