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Nenhures

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22
Fev24

A Defesa no processo eleitoral

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Foram escassos os debates políticos televisivos a que assisti. E não tenho perseguido com efectiva consistência as declarações dos responsáveis partidários nem lido sistematicamente a documentação que os partidos vêm produzindo. Mas perguntei a alguns amigos mais atentos se a minha sensação tem justificação e eles corroboram-na. Ou seja, a questão da Defesa está invisível. É invisível, melhor dizendo.

Certo, é pouco popular, pouco "eleitoral", agitar custos que não sejam dirigidos à putativa melhoria imediata das condições de vida. Na direita propõe-se a redução dos impostos (um tal de "choque fiscal"), em alternativa ao velho arrazoado utópico da amputação das "gorduras do Estado". E na esquerda - onde vigora o sonho geringôncico - não só vigora a mitografia "pacifista", na qual o antibelicismo é confundido com desmilitarização e até mesmo desarmamento, como é vigente a união entre a aversão à democracia e aos compromissos com a NATO. E nisso não esqueçamos as reacções dos partidos comunistas aquando da invasão da Rússia: o PCP sempre defendendo os interesses russos, o BE logo defendendo os direitos expansionistas da Rússia - foi antológico o momento em que Mortágua, então ainda deputada a tempo parcial, usou o argumento nazi de defesa do "espaço vital" da grande Mãe Pátria russa E depois disso, em sinal da generalizada anuência dos seus militantes a esse ideário, foi a futura professora do ISCTE eleita "coordenadora" desse partido.

Ou seja, a ambição geringôncica inibe à esquerda o debate político sobre o reforço do sector da Defesa. E o fervor anti-estatista à direita tem o mesmo efeito. Para mais, os recentes ministérios da Defesa têm sido fragilizados por temáticas pouco "políticas". O antepenúltimo ministro, Azeredo Lopes, foi arrombado por um simples roubo de paiol e a forma como descomandou essa situação inibiu-o de ser voz activa - para além de o ter conduzido ao mais pungente episódio do regime democrático, ao clamar em tribunal a sua incapacidade para exercer o cargo governativo para o qual aceitara o (descuidado?) convite de António Costa. O penúltimo ministro, Cravinho, foi também vítima de difíceis questões orçamentais, que lhe terão reduzido a amplitude das suas hipotéticas ambições estratégicas para o sector. E a actual ministra Carreiras entrou no governo logo após o início da guerra na Ucrânia, o que presumo lhe tenha redireccionado o azimute estratégico para o sector. 

Enfim, há uma continuada irrelevância política associada a um desinvestimento crónico na Defesa, fruto das opções orçamentais deste regime, não só eivadas de questões desenvolvimentistas e também do expurgar da militarização das finanças públicas durante o Estado Novo tardio, mas também da tal ideologia "pacifista" e, explícita ou implicitamente, anti-NATO vigente nos vários sectores da esquerda. O patético recente exemplo dos tanques Leopard, quase todos inoperacionais quando foram convocados para participar no apoio à Ucrânia, deveria ter sido suficiente para convocar a atenção pública. E o ainda pior caso da tripulação do navio que se recusou a sair ao mar, invocando questões securitárias - que eram certeiras, ainda que de inadmissível convocatória daquele modo -, para acompanhar uma embarcação russa que se aproximava das águas territoriais deveria ter sido o sinal extremo. Mas o silêncio continua...

Cumprem-se agora dois anos sobre a invasão da Ucrânia, o grande desafio colocado à NATO desde há décadas. Entretanto o isolacionismo norte-americano, sob retórica orçamental, reafirma-se com Trump. Para atingir o patamar de gastos orçamentais com a Defesa tem Portugal o prazo mais distante dentro dos países da Aliança (apenas em 2030). Ou seja, 40 anos depois da entrada na UE o país mostra-se ainda incapaz de integrar objectivos estratégicos. Que maior demonstração de incapacidade desenvolvimentista terá este regime?

Entretanto, neste contexto de pressão interna e externa sobre a NATO, neste após dois anos de guerra na Ucrânia, a organização convoca os maiores exercícios das últimas décadas, com a participação de 90 000 militares. Portugal participará com ... 37! É evidente que não se requerem umas enormes Forças Armadas nacionais, mas sim funcionais. E que neste caso a pertinência da participação no esforço de defesa comum não obedece apenas a critérios quantitativos. Mas ainda assim, e mesmo sendo leigo na matéria, esta situação causa algum espanto... interpretativo. 

Em última análise estes situação justificaria que se debatesse este assunto. E note-se que este não é assim tão excêntrico. Pois se se debatem temas "sociais", como as reformas ou o sistema de saúde, também são prementes temas que convocam custos estatais direccionados sectorialmente, como a questão do professorado ou das remunerações policiais. E, sem rodeios, debater a questão da Defesa é debater não só o estatuto de Portugal entre os seus aliados mas também - e até mais - debater o estado do Estado de Portugal. Sem patrioteirismo, sem belicismo, apenas com realismo.

Adenda: após ler este postal um amigo enviou-me esta imagem, denotativa do pensamento que os partidos concorrentes dedicam às questões da Defesa, notoriamente inexistente. E acrescenta, muito correctamente, que também nada aparece de substantivo sobre as relações exteriores, os posicionamentos geoestratégicos. Esta é a actual velocidade de cruzeiro deste regime...

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(Postal no Delito de Opinião)

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