Enquanto leio "O Lírio Branco"
Como me é costume aquando nas cercanias do Sado acordo ainda no breu. Depois, já na alvorada, interrompo a inutilidade para um café - gemo, pois já se me acabaram os pacotes de "Gorongosa" e "Vumba" que mãos amigas me haviam ofertado. Estou assim condenado a frascos de "grande superfície", e como é diferente um bom café destas quase chicórias dos pobres... (ainda se fosse Ricoffy, bem batido...). Fumo dois finos "Amber Leaf" e percorro o meu FB, o que cada vez faço menos e por menos tempo, e nesse gradual desprendimento é notório que não vou sozinho. Estou bem-disposto e partilho a minha simpatia através de um punhado de "gostos", face às aprazíveis colocações de alguns amigos.
Noto também várias publicações de há alguns dias - os "laiques" alheios vão-nas mantendo à tona, visíveis neste rosário múltiplo -, resmungando contra o 25 de Novembro. Sorrio, percebo o contexto social e etário dos indignados contra este "fascismo" novembrista, que tem o atrevimento de se celebrar. Na maioria são os "cidadãos com ADSE", esse peculiar universo ideológico. É gente já com implantes dentários, artroses, varizes, alguns artilhados com próteses coronárias, lambuzando-se com pílulas crónicas. Enfim, velhadas como eu, que se rejuvenescem no "ai, no meu tempo é que (quase) era...". E por isso encaro com quase ternura os dislates, tão convictos. E imagino-lhes as "comunas" de Terceira Idade, os comités revolucionários de Seniores, os piquetes d'Idosos, as brigadas Octogenárias ombreando com as Nonagenárias, tudo culminando com o Termidor do binómio cremação-cendrário. Pois todos somos cinza e à cinza voltaremos, anunciou um antigo, e isso independentemente dos disparates que para aqui dizemos...
Estou eu neste registo bíblico e lembro-me do meu pai, o Camarada Pimentel, ateu convicto, que me ensinou vastas coisas. Uma das quais foi o tão rico e apropriado termo "esquerdalho" - esse mesmo que tanto fere alguns dos meus amigos, que nele detectam, sei lá porquê, alguma vilania "(neo)liberal". Nada gostava ele desses "esquerdalhos", os dos "grupelhos", essa malta maoísta/polpotista, a infecunda tralha enverhoxista, nem mesmo dos suspeitosos mas cá escassos titistas, para além dos patuscos trotskistas (que só depois se vieram a transformar em fridakahlistas). Isto para nem falar dos abjectos baadermeinofistas, grapistas e etarras, brigadistas (esses tão avessos ao "compromisso histórico"). E mesmo aquela gente do IRA não lhe caía no regaço. E num dia adolescente estava eu veemente a contestar-lhe o seu arreigado sovietismo e disparei-lhe, impante, "se vivesses na URSS tinhas sido fuzilado" ao que ele ripostou, de imediato, "com toda a certeza!". Como é óbvio o Camarada Pimentel nunca teve conta de Facebook...
Entretanto - e porque estou em registo de crónica do quotidiano - este fim-de-semana acompanhei um querido amigo numa incursão a uma Bertand. Eu nunca entro em livrarias, pois tenho estantes demasiado carregadas e bolsa demasiado vazia. Mas o homem fartou-se de comprar livros e eu, para não parecer mal, qual "intellectualité oblige", escolhi um, este. No final, já na caixa, o tipo foi generoso e ofereceu-mo.
E depois fiquei a ler, tal e qual como se estivesse diante dos "O Escudo de Arverne", "O Combate dos Chefes", "La Zizanie", tantos outros, tão antes do 25 de Novembro ou de Abril, ou mesmo de saber ler. Pois que se lixe o cendrário, que não tenho pressa.