Não embandeirar em arco: as potencialidades do Benfica
(Postal para o És a Nossa Fé)
É sempre bom ganhar o dérbi da Segunda Circular, melhor ainda quando na Luz. E no jogo de ontem ainda foi mais saboroso: após longos meses de desvalorização do plantel do Sporting - por ser "mais curto" (ou "menos profundo", como agora também se diz) - relativamente ao dos rivais; após a repetição - na própria semana passada a seguir à escandaleira do Jamor - da "narrativa" benfiquista de que o título de 21 foi perdido devido ao Covid, apesar dos cento e tal milhões que o clube havia gasto e de ter um treinador que prometera "jogar três vezes mais" do que o técnico anterior (actualmente bem comandando o Wolverhampton no mais difícil campeonato do mundo) fizera; e, num plano mais técnico, após a polémica do último defeso - em que tantos de nós também entrámos - com a opção de deixar sair o excelente mas caro João Mário dada a consciência de que havia no plantel suficientes opções jovens e mais baratas, sublinhando uma política financeira e desportiva virtuosa. Sob estas condições ir à Luz jogar sem Palhinha, dito por todos "insubstituível", e sem Coates, afectado pelo tal Covid da "narrativa" de Rui Costa & Jorge Jesus, e ver jogar Matheus Nunes e Ugarte e toda a defesa, esta sem dois centrais titulares (ainda para mais depois daquele descalabro do Ajax sem Coates), mostra bem a justeza do rumo na constituição do plantel. E a excelência do trabalho da equipa técnica, venha ou não a conquistar títulos neste 21/22.
E em relação a esta jornada há um outro ponto interno ao Sporting que quero realçar. Pois é uma vitória sempre saborosa, e mais significante pelo contexto que descrevo, para além de fazer recuar o velho rival (que já teve 4 pontos de vantagem sobre os actuais comandantes ex aequo e vai agora 4 pontos atrás, o que lhe fará mossa). E porque foi indiscutível, sem "casos", e mostrando uma superioridade que não foi apenas do dia, "conjuntural" - nos dérbis tantas vezes a equipa que está pior vem ao de cima para ganhar. Mas sim uma vitória que denota uma superioridade "estrutural", a vigência actual de um melhor rumo do que o do velho rival. E neste contexto, "sem espinhas", da vitória na Luz - e é esse o factor interno que muito quero realçar -, não se vê o presidente Varandas assomar, em bicos dos pés, em declarações públicas, mais ou menos abrasivas, a querer "mostrar-se para a fotografia". Forma virtuosa de presidir, em particular nas boas horas, deixar o palco para artistas e seus maestros e mestres. Tal como também não se vêem outros membros da direcção. Nem o director do futebol Hugo Viana. Nem "bocas" abrasivas de directores de comunicação do clube, tais como é habitual (e foi-o no clube) naqueles que confundem essa função necessária às grandes empresas com o exercício do trauliterismo mais rústico. Em suma, no rescaldo do jogo de ontem nota-se que não é só no futebol sénior que a atitude é a correcta, mas a sua superestrutura directiva está a marchar e pensar bem.
Mas com tudo isto de positivo é preciso não embandeirar em arco e manter a humildade atenta. Pois apesar da derrota o Benfica mostrou que tem grandes potencialidades para cruzar esta época com sucesso. Já o havia demonstrado, em particular em alguns jogos na Liga dos Campeões. Mas ontem ainda mais, afirmou-se como um clube preparado para enfrentar este futebol do Covidoceno, com as suas características especiais. Será, apesar da derrota, talvez mesmo o clube com mais potencialidades para tal, com maiores energias para soluções originais e criativas: pois estou crente que estas "máscaras brancas" mostradas a Jorge Jesus são uma solução inovadora a nível mundial, e para sempre simbolizarão esta era covidocénica no desporto-rei, no maior espectáculo mundial. E temos que estar atentos, um clube que tem no seu seio estas energias inovadoras, estas soluções criativas, poderá sempre surpreender-nos. E talvez isso demonstre que até possa encontrar outras formas de criatividade.