O Nobel para Annie Ernaux
Fraco leitor de ficção - e ainda pior de poesia -, e cada vez mais enredado em releituras, privilégio da idade, não me surpreende nada ter lido da agora premiada com o Nobel da especialidade, a francesa Annie Ernaux, mas já algo me espanta nunca ter ouvido falar da escritora, sinal de estar ainda mais alheado do que pensava do que se vai escrevendo e lendo.
Entretanto fazem-me chegar a um texto que a "explica", anunciando-a grande leitora de Bourdieu, e de o célebre antropossociólogo lhe ter sido uma grande (determinante?) influência na escrita. É-me isso muito interessante, pois Bourdieu foi-me muito importante quando jovem estudante - é certo que ao fim de alguns livros comecei a resmungar que o homem tinha a deficiência de "tudo explicar", ancorado no que me parecia ser uma sua crença num "homo strategicus". Não sei se estava eu certo nesse meu incómodo, tinha eu 20 e tal anos e depois pouco voltei a lê-lo com verdadeira intensidade, mas foi a ideia que dele me ficou: um bisturi agudíssimo mas demasiado convicto.
Pouco importa, ao anúncio desse laço entre a laureada e o "maître à penser" logo me lembrei de uma deliciosa saída deste último, que me acompanha constantemente, e cito de memória: os sociólogos (entenda-se, os tipos das ciências sociais) têm uma tendência para serem sociólogos dos outros e ideólogos de si mesmos. É uma maravilha, para uso quotidiano, constante... até porque constantemente demonstrada.
Enfim, ainda irei ler Ernaux (é para isso que servem os prémios, são chamadas de atenção). Só espero, mesmo, que seja de escrita menos fastidiosa do que a do velho mestre. Que era, há que dizê-lo, um chato do caraças.