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Nenhures

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10
Mar24

O voto do cidadão

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O voto é um direito, nunca um dever. Resmungo, cigarro matinal numa mão, malga de café na outra, espreitando a ameaça chuvosa, com ideia de trepar a ladeira, 13 minutos em passo estugado para apanhar a camioneta, na senda do Trancão. E com as horas que gastarei, o dia quase todo entre ida, estada e regresso, o dinheiro que gastarei, nos transportes, na bica que decerto urgirá, o almoço, por frugal que seja, e pior ainda se encontrar algum eleitor amigo, motivo quase certo para derrapar até à imperial e meia de febras, comezaina já, enfim um dia perdido, uma canseira... E para quê, o que interessa o meu voto, é só um - pois vale, infelizmente, o mesmo do que o de tantos que votam tão mal!! -, não mudará nada.
 
Decido assim abster-me, guardado está o dia para as minhas coisas. Ainda assim vou confirmar onde é o meu local de voto, para o caso de me aparecer uma inesperada boleia. Entro na página dedicada ao assunto pelo Ministério da Administração Interna. Na qual para se obter essa informação é necessário colocar o número do Cartão de Cidadão (o velho BI)!
 
Estanco! Num "raisparta, tenho de ir votar!" Convocado pois desde há muito tempo este é o único sítio onde me pedem este número. Pois num país onde todos, organismos estatais e empresas (a CTT, por exemplo de ontem, para abrir uma conta digital) pedem o NIF. Reduzindo-me a mero pagador de impostos. E a todos os outros. Enquanto aqui, talvez já só aqui, me tratam como um cidadão.
 
"Raisparta", repito em suspiro. Fumo mais um cigarrito. E sairei até à capital, armado com o meu número de cidadão para votar contra aqueles, e tantos são, que me destratam, apoucam, como pagador de impostos. Mas, nada utópico, convicto de que os votos dos outros e, mais ainda, as mentes alheias, farão que muito em breve para exercer o tal "dever cívico" (dizem-no) será preciso dizer o NIF...

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