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Nenhures

Nenhures

03
Out24

Um colóquio académico

jpt

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Quando voltei a Portugal fui muito bem acolhido pelos meus colegas, logo inserido num centro de investigação e ali mesmo acarinhado, notório o desatinado estado em que aportava. "Em Roma sê romano" é um mandamento, de cidadania e, acima de tudo, de antropologia. Em especial quando se é mesmo cidadão "romano"... ("originário", diz-se alhures). Mas é mandamento muito mais fácil de seguir quando se é... meteco, ("viente", diz-se nessoutro alhures), como eu bem sei, que meteco quase vinte anos fui. Pois sendo cidadão logo um tipo se interroga, até insurge, com as ideologias subjacentes aos pequenos actos, às minudências que são, de facto, pormaiores. Um dia irritei-me com o que considerava (e acertadamente) o funcionalismo estatista, obstáculo ao desenvolvimento nacional, que grassava e anunciei a minha saída. A minha namorada de então foi sarcástica para comigo, e nisso certeira: "estás a ser quixotesco, eles não precisam de ti para nada, nem vão notar"...
 
Os anos passaram, fui para a Bélgica, voltei, chegou o Covid, passou. Nesse entretanto nunca mais tive qualquer ligação institucional com as ciências sociais (leio, mas isso é outra coisa). De facto, o meu tempo passou (sou um "has been", diz-se num outro e mais global alhures).
 
Ainda assim há dias um velho amigo convocou-me para um encontro académico. A ideia era simpática, e não só por ser motivo para o reencontrar, com ele ombrear, pois não o vejo há uma década: constituir um painel para falar sobre fotografia em Moçambique, gente de quatro países e três continentes. Unidos via "zoom" para participar num colóquio organizado por um esconso departamento de uma faculdade pública portuguesa (sem grande relevo internacional, já agora). Até me entusiasmei, pois pretexto para ler de modo sistematizado e, acima de tudo, voltar a escrever... Tratámos de esboçar o texto de apresentação do painel, eu escrevinhei (à mão!, numa camioneta rumo ao Alto Alentejo) a sinopse ("abstract" em academês) da minha apresentação ("paper" nesse linguajar).
 
Depois, já em casa, fui tratar de me inscrever no tal encontro, esse, repito-me, organizado pelo tal departamento de faculdade de universidade pública portuguesa. Já sabia, consabido que é, que vigora a tal ideologia de funcionários ("funcionalista", diria, se o termo não tivesse outro sentido), a qual se traduz na imposição de se pagar para trabalhar, pois é necessário fazê-lo para apresentar o fruto do trabalho intelectual - quase sempre pagam as instituições (públicas, na sua maioria) umas às outras, reproduzindo o mito do "zero-sum game" (como se diz no português correcto), sem o questionar.
 
O custo da minha inscrição? 150 euros! Para falar 15 minutos, via zoom, sem lhes gastar nem café, nem biscoitos baratuchos, nem mesmo o ar condicionado (se o têm). Telefono lá para as cercanias do Cabo Agulhas num "porra, é mais do que eu gasto por mês em água, electricidade, gás e telecomunicações..." e faço cerimónia, não adianto que é mais do que gasto no rancho mensal (uma ou outra "Queen Margot" à parte, quando posso...).
 
Quixotesco sigo, agora sozinho, sem Sancha que me ature. Mas, raisparta, se isto não é o funcionalismo estatista desbragado...! Escrevia há muitos anos o já morto Bourdieu que os sociólogos (e alarga-se aos antropólogos e aos outros todos, os dos estudos culturais e linguístico-literários ainda mais, porque sempre teoricamente enfezados) têm o costume de serem sociólogos dos outros e ideólogos dele próprios. Dizia e acertava na "mouche" (como se diz na bela língua que era a sua).
 
Em suma, 150 euros? Ide roubar para a... escola.

01
Jul24

Fausto

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A morte de Fausto (Fausto Bordalo Dias, como depois veio a ser conhecido) faz-me recuar até aos anos 80 mas também me ancora no presente. Logo me lembro, como a tantos acontecerá, deste "Por Este Rio Acima", um disco magnífico. E uma surpresa na época - pois para além do íntrinseco autoral era muito bem produzido, muitíssimo melhor produto do que era a norma de então, e em especial nos muito básicos oriundos da chamada "canção de intervenção", "cantautores" vieram depois a ser ditos. A indústria musical portuguesa não era tão má, tecnologicamente, como a cinematográfica (esta era verdadeiramente uma desgraça), mas era deficitária. "Por Este Rio Acima" mudou isso. O sucesso, comercial e de reconhecimento, foi enorme. Lembro-me - mas lamentavelmente não encontro via motores de busca - de uma deliciosa primeira página de jornal que dizia "Fausto, o Chalana da Música", noticiando um novo - e bem abonado - contrato com empresa discográfica do músico (que me diziam ser um tipo profissionalmente muito difícil, exigentíssimo, até em demasia), fazendo-o equivaler ao grande ídolo da bola de então...

Mas a memória deste disco também me traz para o presente. Pois em alguma imprensa e na academia de algumas ciências sociais (nisso também na antropologia) vem vigorando um discurso - dito "pócolonial" ou "decolonial" -, militante de uma simplificação demagógica do passado recente e da actualidade. O seu cerne é a afirmação da inexistência de uma "descolonização" intelectual no país, da total perenidade da mundividência colonial, imperial, saudosista, após-1974. Há até textos (o jargão chama-lhes "papers") publicados nos locais "da especialidade", botados por estrangeiros (brasileiros de preferência) ou lusos empenhados, que consagram essa perenidade. Sobrevoam, apressados, o "campo literário", desatentam a (sofrível, repito-me) cinematografia. E aguçam-se, vampirescos, sobre o mundo da música popular, neste último clamando a representatividade, como se universal, daqueles obscuros festivaleiros Da Vinci. E, mais ainda, reproduzindo uma interpretação abjecta de básica desse fenómeno pop que foram os Heróis do Mar. Esses mariolas, sempre avessos à rugosidade do real, sua complexidade e  multiplicidade, a tudo o que não lhes convém às "causas" (e aos subsídios) esquecem, não só a existência como a real influência de objectos que marcaram o país, suas gentes, as mundividências. Lembro a magistral peça "Fernão, Mentes?" da Barraca, logo no início da década de 1980. E nesse já tão recuado 1984 o monumento - tão influente - que foi este "Por Este Rio Acima". Nem tantas outras coisas, as produzidas e as formas da sua recepção pública. 

E continuam "por esses rios abaixo" os tais intelectuais. E nós-outros, os avessos à aldrabice "póscolonial", deveras embrenhados no encapelado da realidade, continuaremos a entoar - e mais agora na morte de Fausto -, "Quem conquista sempre rouba / quem cobiça nunca dá / quem oprime tiraniza / naufraga mil vezes ... Já vou de grilhões nos pés / já vou de algemas nas mãos / de colares ao pescoço / perdido e achado / vendido em leilão / eu já fui mercadoria / lá na praia do Mocá...". Tudo isto, complexo, que não lhes cabe na ladainha, com a qual vão ganhando a vidinha, videirinhos que seguem.

 

28
Jun24

Texto sobre história de Moçambique

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Desta vez não venho vender livros, como quando há meses - e para notório fastio de alguns - fiz, ao tentar impingir o meu "Torna-Viagem". Pois agora apenas dou: um texto longo – seria maior do que um opúsculo, se eu o fizesse como tal. Há anos participei numa homenagem ao historiador José Capela - a que teve este cartaz, que encima o postal -, grande figura da história de Moçambique e de Portugal em Moçambique. E do escravismo. Depois reescrevi o texto. Agora, como o nosso presidente vem recomendando que atentemos nesses assuntos, decidi divulgá-lo - é longo, repito, e não o escrevi para ser fácil, “amigável ao utilizador” mas apenas como dele gosto. E não é, decerto, ajeitável ao uso dos “activistas” de agora. E divulgo-o também para reavivar a homenagem a Capela, homem que esteve bem à frente do seu tempo e da maioria dos (pobres) pares.

Aqui fica a ligação ao meu: "José Capela: o escravismo em Moçambique como violência estruturante".

 

Sobre Capela antes deixara também:

- recensão a "Conde de Ferreira e Cª. Traficantes de Escravos" e "Delfim José de Oliveira, Diário de uma Viagem da Colónia Militar de Lisboa a Tete, 1859-1860", de José Capela;

- "José Soares Martins, de pseudónimo historiador José Capela", quando morreu; 

- recensão a "José Capela, "Caldas Xavier. Relatório dos acontecimentos havidos no prazo Maganja aquém Chire, Moçambique, 1884";

 

24
Mar24

O Affaire Coimbra (4)

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Há algum tempo rebentou a escandaleira do CES da lusa Atenas. Deixei aqui eco desse "Affaire Coimbra" (1, 2, 3  e este extra), que apontava dois tipos consabidamente imprestáveis - só não vira antes quem não quisera ver -, e uma rede eunuca de conúbio. O assunto foi muito falado e depois sendo esquecido. Agora, saiu o resultado do inquérito, nem sequer fui ler as notícias, apenas me sobressaiu um cabeçalho que indicava não terem sido nomeados os mariolas, e que o sénior se declarava "muito sossegado" com os resultados. Sorri, num muito esperado "Safaram-se!!".
 
Dias depois recebo um email circular - decerto que por ter blogado sobre o assunto, pois foi entregue no email do blog - contendo a reacção das queixosas. As quais, afinal, louvam a investigação... Leio com atenção o texto, e constato que os resultados são verdadeiramente letais. Para os malandretes, e para a tal rede conivente. E só percebo que o sénior esteja "muito mais sossegado", tal como os seus sequazes, se presume a continuidade da inércia institucional, a do CES e a das suas tutelas.
 
E é contra isso que - muito avisadamente - as queixosas exigem a acção correctiva e preventiva, no CES, na vetusta universidade dos lentes coimbrões, e nos poderes políticos que a tutelam. A ver vamos, menos distraidamente.
 
Há uma coisa importante no acompanhamento geral deste tipo de casos: não devem ser resumidos à questão sexual, sempre passível de compreensão, mesmo que sarcástica, nisso do ser "normal", "humano", o prof. mais velhote querer "comer a pitazita jeitosa", nisso do marialva "quem nunca pecou que atire a primeira pedra", etc.
 
De facto o que acontece é muito pior e mais alargado, é o culto do revanchismo. Pois se a "miúda" (quantas vezes senhora bem crescida) - ou o efebo - se recusa, e até mesmo quando anui, o que se segue é o longo acabrunhar, menorizar, da sua capacidade, o espezinhar perpétuo. E o minar, torpedear dos percursos, o obstar às carreiras profissionais. Impondo o exílio intelectual, quantas vezes mesmo pretendendo o assassinato moral. E isto não se passa só quando existe a tensão sexual - e até acontece mais vezes sem ela.
 
É uma coisa tétrica, esta autocracia do homo academicus luso. Dela ouvi falar nas gerações anteriores, conheci vários desses monstros - sempre saudados por inúmeras mesuras encomiásticas -, soube de várias situações dessas, mais suaves ou agrestes, na minha geração, algumas sofridas por gente que me é ou era bem próxima. E nem era de sexo que se falava, mas sim do cruel espezinhar, de verdadeira psicose laboral.
 
Também a mim me aconteceu. Não que algum professor me tivesse querido sodomizar - também deveria ser óbvio que arrancaria o falo ao pontapé ao primeiro dengoso que se me chegasse... Mas lembro que eu, e alguns outros colegas, fomos sonegados de bolsas de investigação de dois anos apenas por termos contestado a superficialidade das aulas de mestrado de um professor. E que década depois ainda estive dois anos à espera de um contrato (e cinco meses a trabalhar sem receber) devido aos obstáculos que ele me colocava na administração pública. Como podia tal? Devido à intocabilidade do estatuto de funcionário público, somado à mescla da influência das redes maçónicas e dessa difusa "esquerda católica", esta alimentada da mitografia do "reviralho". Por vezes gente que me conhece diz que eu tenho mau feitio, que me "sobe a mostarda ao nariz". Pois contesto, e recordo que um dia, depois disto tudo, lá no campus da UEM em Maputo, me entrou gabinete adentro o tal ex-padreca antropólogo, a querer falar comigo. E eu falei, aturei. Não o insultei. Nem lhe bati. Sou um santo, estóico.
 
Mas isso dá-me a empiria própria, "o saber de experiência feito", para olhar atento para estes casos, os dos porcos que querem levar as alunas e as assistentes para a cama a troco de (hipotéticos) favores, e os dos escroques que perseguem quem não lhes é fiel, e pisoteiam os que o são.
 
Têm razão as queixosas do "Affaire Coimbra", é necessário uma purga institucional, uma refundação dos procedimentos institucionais, um assumir da tal vetusta universidade que trata os seus mais jovens investigadores-docentes como futricas medievais. E é preciso, em todo o lado, lutar contra esta cultura da apropriação pessoal e do revanchismo. A qual se justifica, legitima como "natural", através de um mito: o da meritocracia.
 
Entretanto, peço a alguém que conheça o tardio enverhoxista e ladino retórico Sousa Santos, que o informe que este "diplomorto etnocêntrico" lhe está "a cuspir na campa". Apenas por desprezo.

19
Nov23

Na rede Academia.edu

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Há já um bom par de anos abri uma conta na academia.edu, uma rede social de cariz académico, algo mais soturno, menos dialogante, do que as outras "redes", mais festivas e/ou assertivas. Lá fui deixando textos meus que -. passe a cagança - julguei (e julgo) um pouco mais significantes. Ou seja, que possam sobreviver um poucochinho de tempo. Alguns de cariz profissional, outros nem tanto... E tenho no computador uma dezena de textos mais compostos, que me exigem ligeiros retoques para os colocar lá.
 
Ontem convoquei um texto de há quase uma década que lá guardara. E ao entrar na conta notei numa curiosidade - ainda mais o é para quem goste de números redondos. É mesmo uma curiosidade pois não ganho rigorosamente nada, material ou simbolicamente, com isso. Mas tem piada. Isso de a minha conta ter ali 5555 inscritos!
 
O que é, afianço para quem não conheça aquela rede, uma monstruosidade. Ainda para mais sendo eu um mero furriel passado à disponibilidade, que escreve em português e sobre coisas algo excêntricas para os interesses predominantes (laivos de antropologia, centrados em temas moçambicanos).
 
É certo que este número pouco diz sobre as leituras reais. E menos ainda sobre o apreço alheio pelos textos. Mas ainda assim?, 5555 inscritos!? Sorri, cagão (repito). E abri uma garrafa de tinto Cabriz (colheita seleccionada 2020), um vinho médio um pouco acima das minhas actuais posses. E com uma taça meio cheia agradeço, o tal cagão mas humilde, a quem tem a paciência de ir ler as minhas tralhas.

26
Set23

Ensaio Sobre Extractivismo Intelectual

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Rotineiras razões médicas levaram-me a Moscavide, tétrica localidade vizinha pois nas cercanias do Trancão. Na qual encontrei este estabelecimento, presumo que sede da consagrada sucursal olivalense "Casa de Frangos de Moscavide", esta sita no Largo do (saudoso) "Ferrador", relevante estabelecimento comercial que durante décadas nos convocou a "percorra Portugal de lés a lés, com meias Ferrador nos pés".

Tendo sido surpreendido, nisso impressionado, por esta "instalação", verdadeiro item de arqueologia urbana, fui assomado pelas recentes memórias, essas que inundam a imprensa, o do ressurgimento do "affaire Coimbra". Pois agora - na sequência de uma suicidária tentativa de censura de um artigo já publicado, como noticia o "Diário de Notícias" (e, já agora, como é grotesco ver a abjecta Fernanda Câncio no encalce de uma mulher que defende um homem acusado de más-práticas) - surgem dezenas de urubus "decoloniais" esvoaçando sobre a fétida carcaça do "abissal" ex-quarentão amante de Enver Hoxha, o tal Boaventura que consta meter a mão na pernoca das alunas, e grasnando histéricos contra o "extractivismo intelectual" que sobre essas coxas larocas ele - pelos vistos - exerceria. Sendo que alguns desses desses gramscianos orgânicos, 40 até, e vários deles até putativos africanistas, emanam da sede boaventuriana, após anos e décadas de silencioso conúbio com os atrevimentos do "Mestre" e a sua constante defesa das ditaduras mais abjectas, nesse aldrabão e desvairado (pós)comunismo anti-ocidental. Mas que agora, com escandalosa impudicícia, surgem mui corajosos na "denúncia" do tal "extractivismo" e quejandos pecados, pecadilhos e, acima de tudo, imensos dislates, do anti-democrático chefe, sábio de retórica sedutora na agregação de financiamentos. Para gente que desde há anos medra sob o arguto moleiro Sousa Santos é caso para lhes atirar o evidente "tarde piastes...". Ou, de outro modo, comeram-lhe da carne mas não lhe roem os ossos, os mariolas.

Mas enfim, o que venho aqui dizer - após ter chegado aos Olivais, fugido das redondezas da sede da "Casa de Frangos de Moscavide" - é sobre esse "extractivismo intelectual". Digo-o com o saber de experiência feita, "muitos anos a virar frangos": nas disciplinas retóricas, aliás ciências sociais, só os franganotes podem ser alvo de "extracção intelectual". E há muitos franganotes que se acoitam nas capoeiras dos galarós. Depois queixam-se? Churrasco com el@s, como agora tanto eles gostam de escrever, na sua patética empáfia libertária. Para mim que venha o churrasco com bastante piripiri, por favor. Para disfarçar o agreste sabor do desprezo.

28
Jul23

Marc Augé

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[Marc Augé] L'anthropologie aujourd'hui
 
Por vezes resmungo com a imprensa "de referência" portuguesa, cheia de aparências "cultas", e nisso de obituários do showbizz ou de cortesãos, "aparatchicos" tantos deles. Alguns dirão "lá está o reaccionário". Seja!
 
Pois é no Facebook - essa malvada "rede social", tão invectivada por ser território de falsidades e futilidades - que vejo a notícia da morte do grande Marc Augé! Há já quatro dias! Googlo e notícias lusas inexistem - e o que o Google não mostra é porque não existe. Incrível, não só pela notoriedade de Augé como pelo facto dele ter sido dos poucos antropólogos publicados em Portugal - já naquela velha colecção de "livros pretos" das Edições 70 (não os tenho aqui mas pelos menos foram editados o "Domínios do Parentesco" e "A Construção do Mundo" - este último por ele organizado). E depois, mais recentemente, foram sendo publicados vários dos seus livros, isto sob o lema que lhe deram, o de "antropólogo do mundo contemporâneo".
 
Enfim, não me vou por a fazer aqui um "obituário" e muito menos uma eulogia - para o fazer a um homem destes faltar-me-ia o "engenho e a arte". Que algum mais graduado o faça, se alguém o entender. Mas já que os "de referência" nada disseram partilho aqui uma sua palestra, "A Antropologia Hoje" - ele começa a falar aos 13'40''. Lamentavelmente o filme não tem legendas e isto fica para francófonos - atenção, Augé tinha uma bela dicção, quem percebe um pouco de francês poderá acompanhar sem problemas o seu pausado e claro falar.

01
Jun23

"Transcolonial" de João Pina-Cabral

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João Pina-Cabral é um dos antropólogos portugueses mais proeminentes - e avanço isto não para o mimar mas porque a disciplina segue bastante clandestina em termos públicos e sendo assim é normal que os seus grandes nomes não sejam muito reconhecidos, contrariamente ao que acontece no universo das disciplinas "primas", mais dadas às "luzes da ribalta".
 
Cresceu parte da sua meninice e adolescência em Moçambique, onde o seu pai era figura relevante do clero anglicano. No início de XXI voltou ao país para leccionar na UEM. Destas últimas estadas resultou um conjunto de textos sobre o país. Há pouco coligiu 13 desses artigos neste "Transcolonial".
 
É um livro problematizador - o melhor que se pode pedir a um livro de antropologia, pelo que dispenso-me de outros requebros e adjectivos. Amanhã, 2.6.23, será (re)apresentado na Feira do Livro de Livro às 19 horas no pavilhão da Imprensa de Ciências Sociais.
 
Deixo aqui o anúncio tanto para os que estejam nas cercanias e se interessem por temas moçambicanos como para aqueles - até das tais disciplinas "primas" - que tenham interesse nas abordagens dos antropólogos. E seria interessante congregar um núcleo heterogéneo para debater o livro.
 
(Nota pessoal para os mais desconfiados - e assim potencialmente renitentes: eu disse que o livro é "problematizador" mas convém juntar que - aleluia - não se trata de "activismo". Ou seja podem ir, podem ler...)

14
Abr23

Uma maionese

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Sei que os meus amigos têm acompanhado com interesse os meus postais sobre temas gastronómicos. Assim sendo aqui regresso a essa matéria. Hoje com uma receita de maionese retórica, bem do agrado dos comensais... "alternativos".

"Os Princípios e as Práticas"

... comecei a analisar a crescente prevalência e maior visibilidade do poder cru em relação ao poder cozido [eu, jpt, detesto esses ditos "emoji" e por isso prefiro assinalar esta grosseira "apropriação cultural" da dicotomia do grande Lévi-Strauss com uns valentes !!!] tendo-me centrado numa das manifestações deste fenómeno, da vitória sobre o adversário ao extermínio do inimigo. Continuo agora a análise, centrando-me na segunda manifestação, a híper-discrepância (sic) entre princípios e práticas.

Uma Híper-Discrepância (sic)

A discrepância entre princípios e práticas é talvez a maior especificidade da modernidade ocidental. Qualquer que seja o tipo de relações de poder (capitalismo, colonialismo e patriarcado) e os campos do seu exercício (político, jurídico, económico, social, religioso, cultural, interpessoal), a proclamação dos princípios e dos valores universais tende a estar em contradição com as práticas concretas do exercício do poder por parte de quem o detém. O que neste domínio é ainda mais específico da modernidade ocidental é o facto de essa contradição passar despercebida na opinião pública e ser mesmo considerada como não existente.  (...)

Este mecanismo de supressão das contradições reside no que designo por linha abissal, uma linha radical que desde o século XVI divide a humanidade em dois grupos: os plenamente humanos e os sub-humanos, sendo estes últimos o conjunto dos corpos colonizados, racializados e sexualizados. 

Se é verdade que a contradição entre princípios e práticas sempre existiu, ela é hoje mais evidente do que nunca. (...)"

Boaventura Sousa Santos, "Os princípios e as práticas", Jornal de Letras, 17 de Novembro de 2021, p. 30.

Bloguista

Livro Torna-Viagem

O meu livro Torna-Viagem - uma colecção de uma centena de crónicas escritas nas últimas duas décadas - é uma publicação na plataforma editorial bookmundo, sendo vendido por encomenda. Para o comprar basta aceder por via desta ligação: Torna-viagem

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