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Nenhures

Nenhures

22
Out24

As ofertas

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Como é viver velho, só (e pobre)?, é o que (não) me perguntam os amigos... E sacio-lhes a curiosidade, explicitando o processo nesta "vinheta etnográfica" (expressão ademane, querida aos antropólogos mais académicos).
 
Viver assim é seguir amparado pela solidariedade benfazeja da "comunidade", esta sempre harmoniosa. E venho sendo cumulado com oferendas, mimosos actos a quererem desalquebrar-me, aliviando-me o calvário até à Mitra. Tantas são elas que cada vez mais venho ouvindo repetidos resmungos de circunvizinhos, queixas de "o Zezé está a sempre a receber prendas, a mim ninguém me dá nada...", coisa da inveja dos abonados, esses gente sempre ávida.
 
Nunca me nego a aceitar, e faço-o com júbilo, pois tendo lido o velho Marcel Mauss sei da obrigação moral em entrar no constante ciclo de dádivas e contra-dádivas (oferecer/receber/tornar a dar/ doar aos deuses). E assim não só acolho como sempre retribuo as ofertas recebidas. Em verve.
 
Hoje é dia desses, como o comprova a mesa do meu matabicho. Um delicioso feijão com óleo de palma - trazido por casal amigo, "o próximo será com feijão manteiga, como deve ser", anunciou a sua bela obreira, dotada de ascendentes saberes e sabores angolanos. Com travo suficiente para desnecessitar do recém-chegado achar de manga, sempre glorioso, transportado de Inhambane por querida (e também bela) amiga, e que veio à mesa estrear-se. Repasto acompanhado pelos livros recebidos ontem, o recente "Nas Terras do Lago Niassa", a excelente (e bem escrita, caramba) tese do camarada Elisio Jossias. E os 4 velhos volumes de Georges Dumézil, o primeiro da trilogia "Mythe et Épopée" que não tinha - "mãe, não precisas de comprar os livros, eu fotocopio-os" disse-lhe eu na Bucholz, com os outros dois tomos (então caríssimos) na mão, e a minha mãe a responder-me com aquele seu ar determinado quando o queria ter "os livros compram-se"... E o "Idées Romaines", o célebre "L'Idéologie Tripartie des Indo-Européens", e o de bolso (PUF) "Les Dieux des Indo-Europeens".
 
E se estou algo comovido com o tão consistente livro do meu mais-novo, estou mesmo deliciado com estas prendas das amigas antropólogas (às antropólogas não as posso dizer "belas" senão acusam-me de "gender issues"). Quem lerá hoje Dumézil? Mas na minha era de estudante universitário foi o que mais me agradou - a par de Leach, claro, mas com este tinha também um apreço másculo, nada "póscolonial", pela sua coragem física e atrevimento intelectual.
 
Dumézil foi-me outra coisa - e se na época não conhecia as críticas "ideológicas" que lhe foram feitas agora estou-me borrifando nelas. Pois era-me encantador, inebriante: "Zé Flávio", disse-me depois, algo atrapalhada, a professora, que então me leccionava duas disciplinas, "importas-te de que te baixe um valor na nota desta e te suba na outra?". "Claro, é-me indiferente" - nessa época eu julgava que ser blasé era boa coisa - "mas porquê?". "É que não gosto de dar 20s", confessou a jovem... O que sempre sorrio nessa memória.
 
Enfim, com tudo isto, o matabicho do velhote foi soberbo. E porque estando só me posso atrever a estes desvios, comiscando o feijão com óleo de palma, debruado com o achar de manga, folheando os velhos Dumézil, decidi pecar e fui bebericar um tinto. Brindando à saúde dos ofertadores. E aos antepassados, divinos ou não, que nos protegeram. E protegem.

13
Ago24

Chamuças et al

jpt

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Há dois anos o José Paulo Pinto Lobo - um tipo gentilíssimo, moçambicano de ascendência goesa que há décadas vive em Portugal, e com o qual me vinha a cruzar desde aquela já longínqua era dos blogs - mandou-me uma mensagem urgentíssima: "Zé, sei que gostas de chamuças, esta semana há umas festas populares na Encarnação, estará lá um amigo conterrâneo que é expert na matéria, vai provar, que ele tem lá uma barraca!" (um stand, como se diz no português burguesote de agora).
 
Arregimentei um comité amigo e avançámos. Em boa hora o fizemos. Chamuças de mestre, inigualáveis. Achares (chutneys, diz-se também) de grande quilate (e uma bebinca de trás da orelha, lembro). E um tipo porreiro ao leme - aliás, estava ali em navegação solitária - o Edgar Bragança.
 
Os anos passam e eu à míngua... Mas há dias avancei na gula. Ele tem a World Masala - Comida com C.alma, que vende comida para fora. Eu tinha uma almoçarada perto do Sado, uma "velha guarda" rabugenta iria enfrentar umas caras de bacalhau (a gente junta-se sempre para umas comidas esponjosas). Julguei ser boa ideia aparecer com uns agrados mais orientais. E perguntei ao Edgar o que me aconselhava a levar...,
 
"Nem pensar nisso", impôs ele, com entoação de tutor. "Anda cá buscar" e decidiu o quê, sem que eu opinasse. Apareci e avançou "isto não é a tua comida, não tem o punch que tu mais queres", "é algo mais calmo". E entregou-me duas generosas doses de Korma de Frango (um caril suave com amêndoas e caju). "Mas isto não é para comeres com os teus amigos", mandou. "É para jantares com uma amiga!" - dado ser um sabor mais adamado, mimoso melhor dizendo -, concluiu, notoriamente preocupado com a minha solteirice. Obedeci. Para depois constatar ser uma delícia, e a amiga também assim pensou, e melhor comeu - ainda que um pouco atrapalhada com a picância, mesmo se esta ligeira, e também algo horrorizada com o conviva que lhe cabia ali, a picar a malagueta vermelha fresca, que o Edgar tinha juntado à embalagem, qual bacela, e com ela aspergir a parcela que me coubera. "Consegues?", dizia ela, até afogueada só de ver....
 
No dia seguinte cruzei o Tejo, integrei a meia dúzia comensal. E antes da bacalhauzada fritámos a meia dúzia de chamuças que também tinham vindo mas que escondera do jantar - pois mimar as senhoras é bom mas também não em demasia. E há que cuidar dos amigos.
 
As chamuças, essas, estavam gloriosas! Recomendo. O homem é mesmo um Sacerdote do chamucismo.

18
Jul24

Mais um sexagenário

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A um bom amigo, desses desde há largas décadas, aconteceu-lhe ontem o que a mim acontecera há pouco: tornou-se sexagenário, e fê-lo com notório empenho. Para celebrar o feito convidou alguns amigos que lhe são mais próximos, e respectivos filhos, para um jantar. O qual decorreu no "Ararate", um restaurante arménio, assim sítio de culinária que eu desconhecia. Foi uma belíssima surpresa. A dúzia e meia de convivas enfrentou uma sucessão verdadeiramente pantagruélica de pratos face aos quais... comi como um jovem.
 
O agrado foi geral. E o entre-carinho foi patente, até glorioso. E talvez também por isso, para além da evidente robustez do aniversariante, não lhe ouvi dedicados alguns ditos que me foram oferendas recentes, aqueles "a vida começa aos 60", "são os novos 40", "vais ver que não custa nada...", e quejandos.
 
Entretanto, e como é usual nestes momentos, houve algumas fotografias, tiradas de vários ângulos, daquelas "para mais tarde recordar". E logo partilhadas. E nisso louvei estar entre gente que conheço há décadas, todos fiéis ao sagrado lema "amigo do meu amigo, meu amigo é". Pois naquele meio pacífico a este sexagenário aconteceu-lhe algo sempre temido: descobriram-me a careca...

17
Jul24

No "Gambrinus" Conversando Sobre Livros

jpt

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O dia fora péssimo, acometera-me uma irritação gigantesca - desnecessária de injusta que tanto a senti -, nisso um gigantesco pico de tensão, tamanho que  me ocorrera, ainda que militante anti-hipocondríaco seja, um "será isto um enfarte?". Mas bom amigo havia-me desafiado para ir petiscar jantar e não me neguei, num "navegar é preciso...", urge viver a vida, parca que esta seja, e sempre na crença de que o bom convívio é bálsamo.  E assim acorri ao "Gambrinus", o balcão lendário, no qual não aportava desde o covid, malvado.

Está o estabelecimento como sempre esteve, excelente! E nisso o que este - cada vez mais  frugal - cliente realça é a qualidade do serviço, a elegância sem mesuras, a atenção acolhedora, a boa educação para isso sumarizar. Cada vez mais rara na cidade, massificada e gentrificada, assim boçalizada. Fomos ambos parcimoniosos, ele bebendo cerveja de pressão mesclada, ali dita "mestiça" - "já não se pode dizer mulata, pá!", esclareceu-me, sábio [Adenda: de imediato recebo nota de um amigo, verdadeiro veterano e sábio: e diz-me ele, "não era nem mulata nem mestiça, era um "gambrinus"!!" Obrigado, Nuno, temos de lá ir "antes que a gente morra"]. E eu fiquei-me na clássica "loura", a qual também mudou de epíteto, é agora remediada como "branca", derivas até paradoxais da actual higiene semântica. Entretanto, ocorreram-nos umas importantes torradinhas debruadas a fino presunto, que por si só justificariam a visita. E cada um de nós enfrentou um trio de croquetes, esses ex-líbris da casa, deliciosos como sempre o foram, satisfazendo o agora também ao convocarem laivos de memórias de incursões no antanho, naqueles apetites juniores ali mesmo recompensados. Este decorrer exagerou-nos a gula, e por isso coroámos o repasto com um prego per capita, "meio-termo" como o deve ser, cuja definição apropriada me exigiria o socorro de um qualquer dicionário de adjectivos, dada a extrema compostura do que me foi apresentado.

Neste entretanto foi diversificada a nossa conversa, flanámos as questões do mundo e da pátria. E depois disso nos apartámos, mergulhando em coisas de livros, lidos e feitos, conversa que se impunha, pois é ele já responsável por um punhado destes  - um dia até se deu ao trabalho, gentilíssimo, de peneirar uma Antologia do Delito de Opinião, blog onde ombreamos, e no qual ele vigora como coordenador -, e acabara de apresentar o seu último "Tudo é Tabu",

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cujo tom freudiano é apenas fonético, uma boa e até urgente "denúncia" do denuncionismo vigente, essa mania dos gringos para cá já importada, e com vigor. Obra que lhe invejo, pois bem ufano ficaria eu se a tivesse feito (e ao trocadilho do título também...).

E nesse entretanto digo-lhe que estou a ler um livro de nosso confrade bloguista e camarada de bancada (mais dele do que de mim, que sigo demasiado relapso ao José de Alvalade), o "Terra Firme", uma incursão pela produção alimentar no Alentejo, do qual muito estou a gostar, pela escrita, nada torneada à máquina sim bem moldada, e nisso macerada de devaneios. 

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Mas mais ainda, até nisso  surpreendido, dada a pertinência analítica e opinativa do José Navarro de Andrade - o qual arranca amiúde certeiros diagnósticos como este, logo à ombreira deste seu alentejanar: "Mas o que é tangencial para os idosos, para os novos é o epítome do inferno. Na desimpedida paisagem do norte alentejano, capaz de encantar os sentimentos telúricos dos forasteiros, os jovens defrontam uma wasteland sem trabalho para eles; e qualquer  esboço de ambição que acalentem de uma existência além de sofrível não cabe ali. Entre velhos e novos, todos os outros ficaram por lá ficar, nem sempre pelas más razões; uma vida ao arrepio de sobressaltos não é um bem negligenciável para quem tende a observar os sinais de progresso pelo óculo do atavismo. Vai-se a ver o  Portugal contemporâneo, no estado em que se pôs, e poder-se-á reflectir se afinal este cepticismo não terá sido avisado" (11). Ele ri-se quando partilho a minha surpresa face ao Navarro armado de escalpelo assim tão aguçado, e nisso obrigo-me a explicar, não fosse deixar medrar engulhos futuros, até melindres, desse que nunca se sabe...: o Navarro é companheiro e bem simpatizo com ele, mas deve ser o único sportinguista que detesta, e nisso é bem veemente, não só o Bruno Fernandes como também o Pedro Gonçalves, o que me deixou dúvidas sobre as suas análises para além-da-bola. Desfeitas agora...

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E continuando neste rumo de leituras amiguistas - mas para me encenar como leitor ávido, que o homem é mesmo voraz nisso -, referi ter acabado este curioso "A Sorte que Tivemos! Um Espectáculo Sobre Abril", um quinteto de textos, um do bom do António Cabrita, ainda lá por Maputo, e que eu vira (com o Navarro, pois eles são amigos) há poucos dias, dois de Rui Cardoso Martins, o qual sempre lembro com um dos raros bons cronistas na "imprensa de referência", nas belas peças nas quais nos trazia a vida dos tribunais, e nisto decerto o apouco, pois dizem-mo bom romancista, e outro de Jacinto Lucas Pires, de quem eu nada lia desde há já décadas.

O Pedro entretanto aflorara já alguns dos seus  projectos de escrita - pois o homem não abranda -, e convocou-me a que me explanasse eu sobre o tão íntimo assunto, inquirindo se estou a seguir os seus bons conselhos. Eu ri-me, pois desde há muito que me exige ele avançar eu numa colecção (re)escrevendo textos (de blog) em que articulo com o meu pai, o "Camarada Pimentel" - "para quê, não terei editora para isso", sempre tartamudeio, "pouco importa isso, avança", responde conduz, a distribuir alento. Mas agora ri-me, e por causa outra: pois neste "A Sorte Que Tivemos!" há um outro texto, "O Cavalheiro de Abril", dedicado ao  tal camarada Pimentel. Uma verdadeira delícia - pelo menos para mim, filho do descrito homenageado -, a deixar-me - mas isso não disse ao Pedro, pois não são coisas confessáveis - choramingando, mesmo chorando, também decerto por estar aqui no escritório dele, diante da sua secretária, na sua poltrona, entre as suas estantes e tantos dos seus livros. Belíssima peça esta vinda da Patrícia Portela, neta amada do meu pai, assim minha sobrinha, e mais do que tudo filha da minha mana tão querida.

"Não seja por  isso", sorriu o Pedro, "avante nisso, e agora ainda mais!". "E também nessas outras tuas ideias", que já me havia eu gabado de uma colecta de resmungos, já reescrita e de título armado, para além de uma espécie de catarpácio de antropologia, minha tapeçaria de Penélope.

Torna-Viagem.jpeg

"Mas para quê?", insisti eu - e nisto já estávamos, a meu pedido, num breve Famous Grouse, vitualha mais adequada a resmungos. Pois se um tipo pouco vende, assim quase nada será lido, de que vale tamanha azáfama? E repeti-lhe, o meu "Torna-Viagem", que me deu uma enorme trabalheira, vendeu 160 exemplares. "Isso é muito bom!", "e ainda por cima nesse sistema de venda por encomenda na internet", disse-me, de novo ensaiando o alentar-me (um "coaching", diz-se no português actual).

Eu gargalho - nada como o tal uísque na mão, não há dúvida - e conto-lhe que aquando das 150 vendas fiz uma informação geral para os meus amigos e conhecidos, anunciando o facto. Descurando aquilo que dissera há meses a um velho amigo - romancista, e bem credor de melhor do que o silêncio leitor que recolhe. O qual é desde sempre, da nossa adolescência, dono de uma consagrada rispidez mas que me acolheu certa vez com surpreendente benevolência, elogiosa até, tanta que temi aparentar eu estar com aspecto deveras moribundo. Mas depois percebi-nos, ele decerto me andaria a ler in-blogs, e tive de o avisar - nisso libertando-o, para que voltasse ao registo agreste que é o dele, é ele, e é assim que deve ser - "éh pá!, atenção pois a autoderisão sarcástica não é lamúria!", ao que ele, lépido, ripostou "mas tens de meter um emoji, que agora já ninguém percebe as ironias"...

Mas, dizia eu, às 150 vendas fiz uma "circular" anunciando o facto. Era o número da minha anunciada utopia comercial! Mas a mensagem era também um sarcasmo, autofágico, e escrevo-o aqui como se fosse o tal emoji. E logo várias pessoas saudaram o sucesso, três académicos publicados dizendo-o com evidente sinceridade, dois outros autores também, sem pingos de ironia, sem odores de "coaching" - coisas que se detectam nas sintaxes, nos léxicos, nas entoações.. Ao que o Pedro, veterano da escrita publicada, resume: "mas são mesmo bons números, há muitos livros mas vendem pouco", haverá leitores e leituras, mas debruçados sobre temas e tons muito diversificados.

E "o  que é necessário", aconselha mesmo, "é que sejamos nós mesmos a fazer a divulgação". Pois não serão as redes sociais - e até porque já desfeita a confraria do bloguismo -, e menos ainda a imprensa. "Já o fiz", defendo-me. "Insiste", diz, autocrata, "repete!". "Impinjo?", aflijo-me, escorropichando o uísque. "Pois!", diz o mais-velho.

E assim saí, saímos, do belíssimo e tão recomendável "Gambrinus". Eu com esta missão auto-atribuída. A de não ser blasé, o que me será fácil pois abomino o blaseísmo. E isto de não ser blasé convoca-me agora a impingir o meu "Torna-Viagem" (que só se compra nesta ligação aposta no título). Mas também, já agora, e não porque qualquer noblesse oblige, estes livros d'amigos.

É Verão, verão que se podem ler. Todos estes que aqui referi têm as ligações apostas nos títulos. Basta comprar, um, vários, todos. E procurar um bom balcão - do "Gambrinus" em dia de festa, um qualquer mais modesto para o dia-a-dia. E ler.

30
Mar24

À mesa a propósito do "Torna-Viagem"

jpt

   ztv.jpeg

 
"Não podes deixar de publicitar o teu Torna-Viagem", escreve-me um amigo, daqueles mesmo..., homem de relevante carreira no comércio cultural, "senão, no frenesim das redes sociais as pessoas esquecem-no. Faz um filme [terá querido dizer um "live", como se diz agora], por exemplo".
 
Hesito, temo cansar os (muito) hipotéticos leitores. Mas acedo à voz sábia. E dou conta dos passos ocorridos. Neste processo editorial constou um almoço com os designers do livro (resmungaram um pouco, não muito, com a falta de total homogeneidade do grafismo nos três exemplares que transporto, atribuível à sua produção avulsa, mas gabaram a impressão).
 

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O repasto foi no excelente Restaurante Zuari, ali a Santos, capitaneado pelo senhor Orlando há mais de 45 anos, desde que partiu de Vilanculos. As chamuças estavam esplêndidas, o meu balchão de camarão supimpa, os convivas deliciados com o que lhes coubera em parte. O achar de limão era de grande efeito. E tudo foi rematado com fatia de bebinca, soberba.
 
Segui até ao fotógrafo que deu a imagem da capa, encontramo-nos na consagrada petiscaria Cockpit Bar, nas cercanias da Av. de Roma, acompanhados de um grupo de beldades ( pois, diga-se o que se disser, até o Fernando é um homem bem apessoado).
 

zuari 1.jpeg

 
Optei pelo gin tónico "à antiga" - ou seja, Gordons, com limão e gelo, sem estas mezinhas de agora, que recorrem à ervanária, e até às essências, assim deixando a empregada entender que não sou eleitor do LIVRE. Entre os "pequenos nadas" que animaram a meia dúzia comensal, foi notado este "camarão à moçambicana", excêntrico àquela tradição nacional, mas bastante saboroso.
 
No final do (longo) repasto todos os convivas haviam veementemente louvado o meu "Torna-Viagem". Certo que ainda não o leram, mas trata-se um claro exemplo de ética da convicção.
 
Neste longo entretanto abordou-se a necessidade de realizar a tradicional cerimónia de "lançamento" do livro. Assim acontecerá, em torno, claro, das sacrossantas chamuças. Será em breve...

 

08
Set23

Meninos?

jpt

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Anteontem jantei no promontório que olha o Sado e avista o Tejo, num pequeno sítio que desconhecia, pois segunda-feira em vilória, mau dia para demandar casas de pasto. Ali uma espécie de absurdo a Sul do Tejo, pois alguém aprontou uma casa de "pastas", uma italianice. Coisa que nunca tem sentido, quanto mais naquele universo rico em saberes de açordas. Refeição partilhada com alguém que mal conheço, estávamos na terceira pessoa e assim ficámos. Fomos frugais: uma entrada de moelas fornecidas de molho com sabor enfarinhado, uma salada de tomate sensaborão com queijo branco, dito fresco. E depois um esparguete partilhado, que o cardápio apresenta em nome estrangeiro. Beberam-se umas imperiais, tudo isso o suficiente para se matar a fome do fim da jorna.
 
Mas o pior de tudo foi o empregado, um rapazola nas cercanias dos trinta anos, com os ademanes concentrados no vozear. Diante de mim e do parceiro de mesa, um quarentão, calva a despontar, passou aquelas duas ou três horas a tratar-nos por "meninos". À segunda imperial estava eu com vontade de lhe dar um par de tabefes, e não estava sozinho nisso. Sou liberal, que cada um faça com os genitais e os anais o que lhe apetece. Mas que vá ele trinar de "meninos" quem o sodomiza, "a falta que a tropa faz a estas gerações" escuto-me, nisso do desagrado com gente pateta que já não aprende a escala etária, aquilo da antiguidade. A mais-velha atrás do balcão estava simpática, como deve ser, presumi que ali algemada ao verme loquaz. Decerto que percebera o desadequado, pela forma como se veio despedir, apaziguadora.
 
Dois dias passaram. Hoje de novo tive a sorte de ser convidado a jantar. Com um amigo, não íntimo mas que se vem tornando próximo, ele recente sexagenário por direito próprio. Agora na capital, no velho CCA, diante do Santo António, uma esplanada de triste nome "Mula" mas com bom serviço e aprazíveis petiscos. Um jovem empregado muitíssimo eficiente e simpático - angolano, por cá há um ano... Perto do final, e depois do meu parceiro ter feito elegante alusão àquilo do meu cinzeiro já estar repleto, eu lançado no "pode-me trazer mais gelo, por favor", surge-nos a chefe de sala, uma simpática e muito bem apessoada brasileira, perguntando-nos "o que desejam os meninos?". Expludo! Para vera surpresa dela... "Não chame "meninos" aos homens", convoco-lhe... E enquanto o mariola do meu parceiro lhe vai dizendo "eu não me importo", defende-se ela argumentando "que aqui todos usam assim". Resmungo-lhe, ainda que procurando ser simpático (ela é, de facto, e repito-me, bem apessoada e estava gentil), que esta é uma moda recente, estúpida, até de desrespeito, isto de chamar "meninos" aos homens. Ri-se, riposta que ao chamar-lhe eu "senhora" a estou a fazer mais velha do que é. Rendo-me, concedo-lhe que "quando cá voltar a Senhora pode chamar-me menino" (ela é, não sei se já o disse, bastante bem apessoada), "mas diga lá aos seus colegas para evitarem isso".
 
Mas de onde virá esta moda, absolutamente patética, de chamar "meninos" aos clientes? Esta gente anda a brincar com quem?

06
Set23

Um almoço em Sines

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A minha querida amiga - ainda que rabugenta e um pouco instável - Vida levou-me hoje até Sines, onde não ia há anos. Acordara eu às 3.30 da manhã, por mandamentos do psicossomático. Umas horas passadas, já sob Sol enublado, bebera a malga de café (Vumba, que moera na véspera) e comera três figos apanhados na hora. E fizera-me à estrada. Bem depois, já cerca das 13 horas, aportei ao A Nau, restaurante sem ademanes na dita Sines, que também resguarda os clientes numa simpática esplanada. E na qual me deparei com um atendimento simpático, até jovial, mas nisso sem exageros. Para a refeição rápida os meus vizinhos de mesa pediram sardinhas assadas - que vieram a louvar. Eu indaguei se os joaquinzinhos o eram ou se seriam Joaquins. Afiançaram-me da justeza do diminutivo. Convoquei a dose. Não que estivesse esfaimado mas em mim grassava já o apetite, dado o historial desta jorna. Trouxeram-me um arroz de tomate solto, que saudei - detesto o habitual arroz de tomate empapado, "malandrinho" dizem-no, pois pesado, sempre gastricamente aziago. E os peixinhos estavam deliciosos. E quando me encontrei saciado o meu prato tinha este aspecto.
 
Após o café chegou a (muito em) conta. E assim aqui deixo a nota, para quem passar pela terra da refinaria - ou do "elefante branco", como há quem a diga. Acomode-se no Restaurante "A Nau". Eu, se voltar à região, repetirei...

Bloguista

Livro Torna-Viagem

O meu livro Torna-Viagem - uma colecção de uma centena de crónicas escritas nas últimas duas décadas - é uma publicação na plataforma editorial bookmundo, sendo vendido por encomenda. Para o comprar basta aceder por via desta ligação: Torna-viagem

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