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1. Um amigo, camarada de anos a fio em Moçambique, e que comunga o meu interesse pelo país e pelo que faz o nosso Estado nas relações bilaterais, e em particular nas questões culturais, avisa-me desta notícia: a nomeação de um novo adido cultural para a embaixada de Maputo, José Amaral Lopes, antigo secretário de Estado da Cultura e antigo presidente do Conselho de Administração do D. Maria II, deputado, entre várias outras posições de destaque. Dado o seu perfil "alto" é surpreendente a sua indicação para este posto, até modesto. Mas para todos que se interessam por estas matérias - a mescla entre "acção cultural externa" e "cooperação" - uma nomeação de alguém com este peso biográfico tem um significado: denota um grande e assisado interesse governamental no desenvolvimento destas relações culturais, decerto articulado com alguma capacidade para reforçar os meios, materiais e humanos, dedicados a essas interacções. Fica-se assim - e mesmo que sem "pedir a Lua" - na expectativa de um período de grande desenvolvimento nas conjugações culturais entre ambos os países. Possamos nós fruir disso!
2. Paralelamente - mas sendo, de facto, uma irrelevância - a notícia desta nomeação tem um factor denotativo da mesquinhez intelectual dos mecanismos partidários, em particular os do PS. Amaral Lopes exerce actualmente as funções de presidente de junta de freguesia, eleito pelo PSD. Abandonará o posto para assumir estas novas funções.
O dirigente lisboeta do PS, David Amado, critica-o por ter abandonado a freguesia, dela fugido. Deixando assim até implícito um elogio ao actual presidente, dado que considera gravosa a sua substituição. Mas é a demonstração da total impudicícia desse dirigente socialista. Pois há poucos meses, nesta mesma sua concelhia partidária, um também presidente de junta de freguesia, o socialista Costa, abdicou das suas funções, indo (sem currículo que o justificasse) liderar um mecanismo televisivo de produção de opinião pública. Amado então nada contestou. Entretanto, aqui nos Olivais a socialista presidente de Junta, Rute Lima, aquando reeleita logo se foi a trabalhar para a nova Câmara PS de Loures, e vem por cá "exercendo" funções em regime "parcial". E Amado ficou mudo.
E já agora, até porque o postal é sobre "cultura" e nisso "bibliotecas" - a do Camões em Maputo é muito relevante na cidade - convém relembrar que a biblioteca da Junta de Freguesia dos Olivais, a antiga Bedeteca, sita no Palácio do Contador-Mor (sempre associado aos Olivaes dos Maias) está fechada há mais de três anos. Devido a umas obras não estruturais, que se diz terem sido cabimentadas 2 vezes (!!!), e que se vieram arrastando por incúria da junta socialista - estando agora culminadas sem que a biblioteca reabra. Diz-se no bairro, e quem sabe, que estaria prevista a reabertura para o início deste Verão, depois para Outubro. Mas que deverá acontecer apenas cerca do Ano Novo - para agitar as águas em ano de eleições autárquicas. Sobre tudo isto - e tanto mais - não fala o tal David Amado. Nem as hostes socialistas.
Fui votar de manhã (e votei bem). Como desta vez se pode fazê-lo em qualquer lugar, em vez de ir até às traseiras de casa, como sempre, fui até ali à frente, à Biblioteca dos Olivais. Foi forma de matar saudades pois a Biblioteca está fechada há mais de três anos (há quem afiance que há já 4...), devido a umas obras superficiais que a Junta de Freguesia tem descurado de modo escandaloso (dizem-me que até foram financiadas duas vezes mas não posso afiançar). O que é engraçado é que indo à página da Junta vê-se como Rute Lima (a presidente em part-time) e seus correligionários PS anunciam os trabalhos sobre um novo jardim que vão instalar em homenagem ao Zé Pedro. Mas nada sobre a reabertura da biblioteca. O que muito me faz lembrar aquilo dos "coronéis" brasileiros do Jorge Amado, que se limitavam a ajardinar para legitimar as malandrices....
Enfim, é o PS nos Olivais, em Lisboa. E Portugal. A "esquerda", dizem, avessa ao "obscurantismo", gabavam-se. E nós, que não gostamos de duplos financiamentos para obras públicas e até vamos às bibliotecas, somos ... "neoliberais", "reaccionários". De "direita"....
Ontem, após o Bayern-Real Madrid, visto em grupo de amigos no café agora "must" dos Olivais, e enquanto se escorropichava a última "imperial", lamentei-me de estar esfaimado. Logo me levaram à Encarnação, onde decorrem as "festas populares". À chegada ouvia-se os UHF. Acorri, constatando que há quase 40 anos não via o grupo de António Manuel Ribeiro ao vivo, laivos saudosistas até.... Quando lá chegámos tocavam a célebre "Cavalos de Corrida"... Depois vieram os "encore", uma "Grândola..." apenas vocal, entoada em registo roufenho com uma senhora da organização (quiçá da Junta).
Entretanto abastecemo-nos dos ambicionados petiscos, fornecidos nas barracas de "comes e bebes", vizinhas dos carrinhos de choque, eu com uma bifana das antigas, daquelas oriundas daqueles pântanos de molhanga com ar vetusto. Enquanto deglutia o manjar voou-me a mente para alhures. Um dos camaradas de comezaina notou-o e indagou o que comigo se passava.
"Estou velho!", resmunguei, lamentando-me. E expliquei-me. Pois no meu bairro de sempre, junto a amigos, diante de imperial e bifana, UHF a rockarem, no que atento é nisto: em pleno centro de Lisboa, esta Junta de Freguesia do PS, essa da presidente Rute Lima (colunista do "Público") e da "vereadora" Vanda Stuart, monta mais uma festarola e clama em cartaz "Há Cultura nos Olivais". E associa isso ao democrático e desenvolvimentista "25 de Abril".
E entretanto a Biblioteca dos Olivais, a antiga BDteca, está encerrada há três anos, ou mais, devido a obras até superficiais, mas tão proteladas de esquecidas, depois como se abandonadas, pois nunca cuidadas. Apenas por desinteresse desta gente PS. Vil e ignorante gente.
"Sou um reaccionário!", concluí. Rimo-nos. E pedimos mais uma rodada de imperiais.
O governo do PS caiu na sequência de um conjunto de "casos e casinhos" - expressão criada para desvalorizar uma inusitada sucessão de desatinos (como o patético "affaire computador"), os quais culminaram no verdadeiro "casão" Escária. E os seus dois antecessores caracterizaram-se por despistes em exercício, em particular o segundo (como os trambolhões sonoros na Defesa e na Administração Interna), e por uma demasiada "endogamia" - incorrecto termo usado para aludir à teia de relações familiares que albergavam, em particular o primeiro. E é ainda indelével no historial PS ter o período Costa sucedido à governação Sócrates, o pior momento deste regime, mas ainda assim defendido até à última pelo partido e pela sua mole de produtores de opinião pública (como Galamba ou Adão e Silva, que Costa veio a recompensar ao elevá-los ao governo).
Não se trata de clamar que tudo isso é "corrupção", que não o é - isto para além de "corrupção" existir em todos os regimes, em todos os quadrantes ideológicos, e de poder grassar em todo o tipo de poderes quando eleitos ou nomeados. Ou nepotismo, pois nem tudo o é. E também não se pode reduzir isto a uma "incompetência" que seja típica daquele partido e seus "companheiros de estrada", disponíveis para com o PS governar ou administrar o sector público. Pois também em todos os regimes e quadrantes ideológicos há escolhas desadequadas ou efeitos do inesperado nas coisas públicas.
Mas tudo isto enuncia duas características deste PS de XXI: a incapacidade - talvez devida à crença da sua desnecessidade - para cooptar um amplo leque de "homens bons" (de competentes pessoas de bem, dir-se-á hoje) da sociedade para o exercício do poder; e, talvez mais do que tudo, a inexistência de uma autocrítica, interna que seja, algo que sempre transparece um enquistar castrense típico em "partido de poder" exaurido.
Haverá gente do PS, e não só, crente em que a mudança de líder inflectirá alguns rumos políticos e influenciará as práticas no poder. Independentemente disso ser pouco crível com Santos. Não só porque vem demonstrando um verdadeiro e atrapalhado vácuo programático mas, acima de tudo, porque foi consagrado como o "campeão" do aparelho partidário. E é neste que radica o problema.
Ou seja, não se justifica esperar mudanças positivas - desenvolvimentistas, por assim dizer - no PS. Não por causa deste novo secretário-geral ou de qualquer seu hipotético sucessor. Mas devido à mundividência que grassou e acampou no partido, nas redes que este constitui com a "sociedade civil", esse amplexo do qual emana Santos e emanarão seus sucessores. Mundividência e respectivas práticas que seguem, repito, imunes à autocrítica. E encastradas na aversão a críticas alheias.
Um exemplo paradigmático, pois denotativo, de tudo isto é o que vem acontecendo na Junta de Freguesia dos Olivais. Uma minudência, dirão alguns. Mas são 32 mil eleitores - muito mais do que em tantos municípios -, sitos no centro da capital. O PS domina a Junta desde 1990, diz-se que nele teve o presidente de Junta com mais tempo em funções no país, Rosa do Egipto, ao qual sucedeu a actual presidente, Rute Lima., também colunista do jornal "de referência" Público.
Desde que regressei a Portugal tenho escrito alguns postais como freguês desta freguesia: alguma fragilidade dos serviços da Junta - à qual agora se pode aduzir o encerramento da biblioteca pública (a ex-Bedeteca) desde há anos, para se realizarem umas relativamente simples obras de reabilitação, uma situação lamentável e incompreensível de inércia. E o tom verdadeiramente populista da sua presidência, com a desbragada utilização dos serviços da Junta - e seu boletim mensal gratuito - para engradecimento pessoal da figura da presidente Rute Lima, no posto há vários mandatos.
Também aqui deixei nota - e testemunho iconográfico - da minha irada estupefacção quando em recentes eleições ter notado que o pessoal contratado pela Junta para assistência nas assembleias de voto surgir com camisas com símbolos gémeos ao da candidatura socialista, evidente caciquismo rasteiro. Enfim, um rosário de indigências mentais, surpreendentes por vigorarem nesta Lisboa actual. Quanto ao resto, o verdadeiro funcionamento da Junta, há o constante "diz-que-diz" de fregueses, coisas até plausíveis mas apenas "conversas de café", impublicáveis.
E bem aqui insisti, com pormenor, que nas últimas autárquicas para a surpreendente derrota eleitoral do candidato socialista Medina foram suficientes os votos que o PS perdeu na freguesia Olivais.
Entretanto, no ano passado houve três reportagens televisivas, detalhadas, anunciando desmandos económicos na Junta. Algumas das referências eram até pungentes - gravações que demonstram haver uma vogal que alimenta a família com a comida das cantinas escolares, por exemplo. Contratações de familiares directos de gente em funções. Aparentes minudências dessas. Nesses dias houve alguns ecos mas mais nada se soube. A presidente Rute Lima - que exerce (ou exerceu) o seu cargo em part-time, pois foi cooptada para a gestão municipal de Loures pelo seu novo presidente socialista, algo peculiar numa freguesia desta dimensão - seguiu incólume.
No final do ano 23 saiu mais um dos característicos boletins da Junta, sempre "Rutecentrados", como comprova a imagem que encima o postal. Ombreando com (mais) uma longa entrevista auto-laudatória a omnipresente Lima escreve no seu editorial, dedicado aos seus "Queridas e Queridos Olivalenses", uma denúncia daquela "espuma que é uma nova forma de estar na política" que conduziu "a forma sórdida a que todos fomos expostos, naquele que foi um ataque inqualificável ao Executivo". Em Fevereiro a Polícia Judiciária fez buscas durante um dia na Junta.
Friso, não há arguidos, não há culpados. Mas há décadas "disto": de comer das cantinas, pelo menos. Deste despautério caciquista. E do PS ser incapaz de se apartar, autocriticamente, deste tipo de gente. Deste tipo de práticas. Desta... mundividência.
Entenda-se bem, o PS não muda, nem mudará. Pois o PS, este que vai a votos, é Rute Lima.
Ontem, Estação de Metropolitano de Chelas, quase 23 horas. Comboio parado, luta de grupos - verdadeiramente multicultural. Tem ar de coisa avulsa, mera "zangadaria", não aparentando ser confronto de grupos "orgânicos" (os sempre ditos "gangs"). Nada de tiros, felizmente, nem se vêm brandir naifas, pedras ou coisas do género. Mas muito mais a tradicional gritaria histérica. A passageira brasileira que me ladeia - talvez por me ver seráfico, ainda que amarfanhando o pobre livro de bolso - pergunta-me "é preciso esperar que chegue a polícia?" antes que retomemos o nosso rumo, pois "assim vou perder o autocarro das 11...". Respondo-lhe, fleumático - já espreitei, notei a tal ausência de armas e a prevalência dos apenas símios gritadores, tendencialmente inofensivos - "não faço a mínima ideia, nunca vi uma coisa assim". Crianças choram, mulheres praguejam, transumância entre carruagens, velhos caducos caducam. Um destes, que é da zona - di-lo pelo sotaque e, mais do que tudo, através dos trejeitos -, logo avança a bom som as suas explicações para o caso pois "há pretos", olhado com algum espanto pelos circundantes ali retidos, entre os quais haverá um ou outro "branco" para além de mim e dele, e da brasileira (a qual talvez se reclamasse, lá no país dela, "parda" para ver se colheria alguns apoios estatais). Os dois sikhs estão calados, ainda que os turbantes lhes pendam um pouco. Imensos brasileiros brasileiram, e como praguejam!, comprovando os seus "avôs transmontanos", apesar de serem - se necessário - também "afrodescendentes". Os chavalos de Chelas seguem a la Olivais, não se ficando atrás no esbracejar e no vernáculo, mas este sai-lhes sem o trinado arábico típico do nosso bairro. Não há dúvida, para além da Marechal Gomes da Costa o sotaque é diferente. A malta PALOP está calada e furiosa com estes atrasos a atrasar o descanso. E alguma olha-me, quero eu imaginar, com simpatia - haverá algo no meu semblante que dirá por onde andei? Ou será por ser o único dos dois velhos tugas brancos que ali não clama "há pretos"? Os funcionários estão excitados, cais acima, cais abaixo, armados de velhos Motorola, ou similares. Enfim, espera-se a polícia. Milhazes é citado com abundância. Uma das alas contendoras avança e dissemina-se na minha carruagem, continuando a gritar os impropérios que são rescaldo, catarse e ressaca.
O comboio avança. Mais uma estação e chego ao destino. Estou, verdadeiramente, em casa. Na escada rolante um companheiro de viagem, talvez angolano, murmura-me, entreolhando-me, "filhos da puta!". Sorrio-lhe, encolhendo os ombros. E não lhe digo o que penso: somos, de facto, aqui e agora, nós os dois, lusófonos!
Ainda que estes anos de bloguismo (e subsequentes redes sociais) me tenham proporcionado simpático convívio digital e algumas agradáveis interacções pessoais, tenho a sensação de que o meu papel Iluminista tem sido subavaliado, até menosprezado. E não haverá maior prova do que esta - como o poderão comprovar os visitantes dos blogs em que escrevo e as minhas ligações no Facebook: há anos que recorrentemente aludo ao Trancão, colhendo espanto, desconhecimento, indiferença ou, ocasionais, pedidos de esclarecimento sobre a sua natureza e paradeiro.
Mas agora, e por causa do Santo Padre, já todos falam do Trancão como se com ele fossem tu cá, tu lá... O meu papel precursor nesta temática é apagado. Ressinto-me disso. Pois só não se sente quem não é filho de boa gente...
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